Mourão e a revelação do enigmático “Grande Acordo Nacional”

Por Wellington Calasans, para o Duplo Expresso

No dia 29 de dezembro, quando publiquei o texto com o título “Mourão, o pigmeu tupiniquim com complexo de Deus” trouxe para o debate as semelhanças entre Bolsonaro e Mourão, mas já advertia para o fato do primeiro ser um fantoche, enquanto o segundo é visivelmente mais ambicioso e sequer consegue disfarçar o desejo de ser o novo Pinochet.

Enquanto a falsa esquerda brasileira brinca de guerra de bandeiras identitárias, os avanços contra as Leis, Direitos e soberanias (nacional e popular) estão na pauta daqueles que estão no poder. Há algo errado quando uma “esquerda” celebra a hipótese de Mourão substituir Bolsonaro como uma conquista e usar como argumento “com Mourão será melhor do que com Bolsonaro”. Isso é atestado de inutilidade política e incapacidade de levar ao povo uma alternativa ao que finge combater. 

Bolsonaro é o que é e todos já sabiam. Ele entrou nas mentes e vísceras dos brasileiros exatamente porque é a liberdade e normalização do monstro que todos carregamos dentro de nós mesmos e que lutamos para domar. É a prova concreta da conivência da Globo com mais um golpe contra a democracia, mais um vice como Cavalo de Tróia.

O “grande acordo nacional” de Romero Jucá é algo continuado. Algumas revelações são em muitos momentos previsíveis, mas outras parecem nos desafiar a não acreditar que sejam verdadeiras, tamanha a decepção que causam. O “grande acordo nacional” envergonha ainda mais por não incluir o povo (milhões de brasileiros) na “festa democrática da pacificação”.

Aquele que hoje exalta a frase sobre Jean Wyllys (marotamente editada pela Globo) que teria sido pronunciada pelo candidato à Presidência em uma eleição sem povo, o vice de Bolsonaro, é o mesmo que ignora o passado recente do General Antônio Hamilton Martins Mourão, de que este fora retirado do CMS após criticar o governo federal (Dilma) e deixar que ocorresse em Santa Maria uma homenagem de subordinados seus a um dos símbolos do regime militar (1964-1985), o coronel Brilhante Ustra.

Sobre Jean Wyllys, após estar com o seu presidente (Bolsonaro) Mourão disse o seguinte:

Quando a gente diz que está ameaçado, tem que dizer por quem, como. Vamos aguardar” (…) “Não estou na chuteira do Jean Wyllys, ele é que sabe qual é o grau de confusão que ele está metido” (…) “quem ameaça parlamentar está cometendo um crime contra a democracia.”

O que a Globo e a “globosfera” destacaram?

Quem ameaça parlamentar está cometendo um crime contra a democracia.”

A campanha pró-Mourão anda a todo vapor. Não surpreenderia se o “grande acordo nacional” incluísse um “fica, Jean!”, proferido a plenos pulmões pelo, agora estadista, Mourão. O mesmo que em uma conferência no dia 17 de setembro de 2015, três meses antes do ex-deputado Eduardo Cunha dar inicio ao processo de impeachment de Dilma Rousseff, fazia uma palestra na qual pedia “o despertar de uma luta patriótica” porque a saída de Dilma não alteraria o “status quo” e que “a vantagem da mudança seria o descarte da incompetência, má gestão e corrupção”. É esta figura que a “esquerda” aceita como um estadista?

Respeito a decisão do Deputado Jean Wyllys e desejo boa sorte ao seu substituto que, por coincidência, também é LGBT (será que era homofobia,  “Jeanfobia” ou fobia do Jean? Isso é outro debate). O que considero importante é atentar para o fato de que Mourão faz hoje com Bolsonaro – com o visível apoio da Globo e de setores da “esquerda” – o que traçou como possíveis cenários para Dilma Rousseff: “sobrevida ou queda controlada”. Este é o estadista que tentam esconder, o mesmo que fez referência ao “31 de março” como uma “grande data”. Naquela oportunidade, a declaração que foi vista por muitos como uma apologia indireta ao movimento militar que derrubou o então presidente João Goulart, em 1964.

O, agora estadista, General Mourão fez apologia à intervenção militar menos de dois anos depois de ter sido afastado do CMS. Em palestra realizada em uma loja maçônica de Brasília, o general falou por três vezes na possibilidade de intervenção militar diante da crise enfrentada pelo país. Numa delas, disse que a tomada de poder pelos militares pode ser adotada no país caso o Poder Judiciário “não solucione o problema político”. Hoje todos sabemos que o Judiciário é controlado pelas Forças Armadas e o “problema político” está agravado. Já andam cogitando por aí que Lula seria solto por um “Mourão estadista”. Uma moeda de troca para a entrega total do Brasil. Seria o apogeu do “Grande Acordo Nacional”? Perguntar não ofende.

Naquela mesma palestra na loja maçônica, o, agora estadista, general Mourão afirmou que seus “companheiros do Alto Comando do Exército” entendem que essa “imposição não será fácil” e avaliam que “ainda não é o momento para a ação, mas admitem que ela poderá ocorrer (golpe militar)”. Desencorajado a ser o candidato à presidência, Mourão construiu o seu caminho para dar ares de democracia à chegada no poder dos militares. Hoje ele trabalha sem pudor para consolidar a “missão” de implementar o golpe militar sem farda.

É revoltante que tentem viabilizar como estadista um candidato a Pinochet (com direito a Paulo Guedes e “Brazilian Boys’’) que recentemente afirmou que “Uma Constituição não precisa ser feita por eleitos pelo povo”. O, ainda, vice de Jair Bolsonaro disse que a elaboração da última Constituição brasileira, de 1988, por parlamentares eleitos, “foi um erro”, e defendeu que a nova Carta deveria ser criada por “grandes juristas e constitucionalistas”. Democracia sem povo? É isso que significa ser um estadista?

O, agora estadista, general Mourão – que defende o “branqueamento da raça” como o novo padrão estético – é o mesmo que “denuncia” a “indolência do índio” e a “malandragem do africano”. Tudo, segundo o candidato a novo Pinochet,  baseado em fundamentos de “estudiosos gabaritados”. Será que entre os “estudiosos gabaritados” estariam o seu parceiro de chapa, Jair Bolsonaro e o guru Olavo de Carvalho?

O, agora estadista, general Hamilton Mourão – que promoveu o filho no Banco do Brasil – é o mesmo que criticou o pagamento do 13º salário e do adicional de férias aos trabalhadores. Chamou os direitos trabalhistas de “jabuticabas brasileiras”. Assim como Bolsonaro, tem mais pena do empresário do que do empregado. É uma pessoa com esse tipo de mentalidade que querem convencer você a acreditar ser um estadista. Tudo no pacote do “grande acordo nacional”.

Mourão é um Bolsonaro piorado. Um militar com uma missão a cumprir: entregar o Brasil e escravizar o povo brasileiro. Para promover a reforma da previdência fará qualquer coisa. Para “dar aos norte-americanos”, usará a força bruta e será apresentado pela imprensa (inclusive a que afirma ser “de esquerda”) como “melhor do que Bolsonaro”. Ora, se ele fosse “melhor” teria sido o cabeça de chapa. Nesse caso, ser vice de alguém como Bolsonaro é ser pior do que ele.

É lastimável que os cargos, penduricalhos e verbas publicitárias estejam a ser colocados acima de todas as evidências de que Mourão como presidente será muito pior do que Bolsonaro, pois tomará gosto pelo poder e aprofundará a perseguição contra todo e qualquer foco de resistência ao seu projeto de ser o novo Pinochet.

Longe de defender Bolsoraro (que é o que todos sabem o que ele é), proponho uma resistência à chapa Bolsonaro/Mourão. Foi assim que eles chegaram ao poder: juntinhos. É assim que deverão sair de lá. No lugar de querer ser o novo MDB da nova ditadura, a oposição precisa deixar de ser pelega (como tem sido nas últimas décadas) e fazer o que sempre teve medo (para não perder o controle da “boiada vermelha”): politizar a sociedade, nas bases, e partir para o enfrentamento. Quatro anos seriam nada se comparados com a eternização no poder do, agora estadista, general Mourão.

Bônus

Para facilitar a sua compreensão, podemos resumir da seguinte maneira: a Globo, setores da “esquerda” e o “mercado” querem que você acredite na promessa de Mourão: “só vou botar a cabecinha”. Eles não estão dizendo que “não tem ombro” e muito menos o tamanho do “problema” que você terá que ‘entubar’.”

Espero ter sido claro.

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Romulus Maya

Advogado internacionalista. 12 anos exilado do Brasil. Conta na SUÍÇA, sim, mas não numerada e sem numerário! Co-apresentador do @duploexpresso e blogueiro.

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