Caminhoneiros, Lula e o fim de Temer – Parte 1 de “MDB e governabilidade”
Por Gustavo Galvão[1], para o Duplo Expresso
- Ciro Gomes disse que, se eleito, iria “destruir o MDB”. Não há dúvidas de que isso seja uma hipocrisia demagógica. Não vê contradição em, ao mesmo tempo, procurar apoio do PP e do DEM, partidos mais à direita do que o MDB, que votam mais afinados com o governo Temer do que seu próprio partido. E ambos com problemas maiores com a Lava-Jato. Ele busca pegar carona na mídia, que elegeu seu novo “sindicato dos ladrões”, depois do PT. Nesse caso, Ciro, Bolsonaro, Alckmin e os generais que gostam de Twitter estão com discursos parecidos. Todos eles pegando carona no diversionismo de culpar o MDB por tudo o que acontece no país e desviar a atenção da destruição da economia, dos direitos, da democracia e da incrível popularidade do maior preso político do país.
- “Destruir o MDB”, na verdade, será só um teatro que não muda nada. Vão pegar Temer e mais uns três e o resto do partido vai mudar de legenda indo para o partido do novo Presidente e seus aliados mais próximos.
(Aqui, link para a Parte 2)
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A busca do super-vilão
Há alguns anos inventaram um super-herói brasileiro: um tal de Sejumoro, uma mistura de juiz, Ministério Público Federal e monopólio de TV. Como todo filme de ficção, o super-herói precisava de super-vilão, um tal de Lula. Um cara que pouco tempo antes saiu da presidência com a melhor avaliação da história de um político em um regime democrático: 87% de ótimo e bom e 9% de regular. Ou seja, uma rejeição (ruim + péssimo) de apenas 4%! Uma popularidade inédita em uma grande democracia.
Entre 2013 e 2016 a imprensa, o judiciário e os políticos, sob orientação estrangeira, diariamente culparam Lula de tudo de ruim que acontecia e até sobre o que não acontecia. Inventaram até uma crise que nunca existiu. Entre 2013 e 2014 o Brasil estava no melhor momento da sua história do ponto de vista econômico e social, mas a imprensa e as mentiras espalhadas pelas redes sociais diziam que estávamos na pior das crises.
Em 2014 tínhamos o maior salário médio da nossa história, o menor desemprego, a maior proporção de empregos com carteira assinada, a melhor renda per capita, a menor dívida pública em proporção do PIB em 40 anos, o mais longo período de baixa inflação em regime democrático, a menor taxa de criminalidade em 20 anos. Não erámos a Suíça, mas estávamos avançando muito bem. E o pré-sal certamente iria diminuir muito nossa distância sócio-econômica em relação à Europa.
Nessa situação de relativa prosperidade para um país que sempre foi pobre, muitos foram manipulados para “pedir seu país de volta”. Talvez de volta para o colo de Tio Sam e do atraso social.
Bem, conseguiram. Depois do golpe, o país ficou em frangalhos. As pessoas ficaram muito mais infelizes, mas conseguiram “seu país de volta” . I.e., de volta à crise dos anos 80.
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Choque de realidade: Sejumoro e os caminhoneiros
O povo enganado está percebendo que caiu em uma furada e está se voltando contra aqueles que o ludibriaram. Como consequência, a popularidade do Lula, mesmo preso, não para de aumentar. Ao mesmo tempo, a popularidade de Sejumoro não para de cair. O povo está percebendo que não existem super-heróis no mundo real. Está percebendo também que estadistas e líderes, sim, existem. E, embora raros, são imprescindíveis.
Para complicar a situação dos golpistas, a greve dos caminhoneiros foi um choque de realidade no povo. As pessoas começam a perceber que não adianta elas se voltarem a posturas individualistas de se fecharem aos posicionamentos políticos, pois estamos em uma sociedade onde o trabalho e a vida das pessoas são altamente dependentes da coletividade. Se a coletividade e a infraestrutura pública não funcionam em prol do público e do coletivo, eles vão sofrer.
O mundo de fantasias de Sejumoro não vai colocar o prato na mesa, as crianças na escola, a segurança nas ruas e a gasolina no tanque.
Quem cuidava disso agora está preso. Sejumoro não cuida de ninguém. Só cuida de suas festas com ricaços no exterior para comemorar a prisão do líder do povo.
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Os caminhoneiros vão voltar
Temer, colocado na Presidência pela Lava-Jato e seus amigos, descumpriu a maioria dos pontos combinados com os caminhoneiros. Os acionistas privados da Petrobrás (quem são eles?) não permitem. As petroleiras estrangeiras que querem privatizar a Petrobrás tampouco.
Temer não tem vontade própria. Cumpre ordens.
Por isso, os caminhoneiros já estão planejando uma próxima greve, que, dizem, será ainda mais dura.
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Criando um novo super-vilão: o MDB
Temer não resiste a outra greve. Sejumoro também está preocupado: ele foi contra a primeira. A greve traz o mundo real para a pauta das famílias, tira as fantasias da Globo e do Sejumoro do noticiário e das conversas.
O mundo real incomoda muito a Globo e Sejumoro, pois se o povo está preocupado com o mundo real, comida, gasolina, emprego, hospitais e escolas, vai votar nos candidatos progressistas.
Mas se, ao invés do mundo real, o povo se preocupa em prender o super-vilão, o governo escolhido pela Globo e Sejumoro pode entregar tudo para o capital estrangeiro: terras, Petrobrás, Eletrobrás, pré-sal, minérios, direitos dos trabalhadores, previdência, etc.
Como entreter o povo na caçada ao super-vilão, se ele e seu estrategista, José Dirceu, já estão presos?
Sem eles o PT não mete medo nos donos do poder. Mesmo porque não estão no poder e é muito difícil achar crimes atribuíveis a políticos do PT. No caso do Lula e Dirceu certamente houve uma completa distorção do processo para inventar provas que não existem.
Se outros petistas não são tão bons super-vilões, basta criar um outro. E Temer é perfeito para isso.
Porém, Temer é muito fraco para purgar todas as culpas do país. É preciso mais do que um super-vilão, é preciso uma convenção nacional de super-vilões, uma grande quadrilha para assustar o povo.
Essa convenção nacional, esse sindicato (argh!) de supervilões já está escolhido: é o MDB.
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Temer não vai sozinho!
Para que o povo volte a se desligar do mundo real, foram acionados todos os instrumentos de propaganda para colocar a culpa de tudo sobre o MDB. Como já tinham feito contra o PT, Collor, Sarney, Jango, JK e Vargas. É evidente que não quero comparar Collor, Sarney e MDB com PT, Jango, JK e Vargas. Uns são conservadores e outros são progressistas.
Mas, para quem está inventando super-vilões para desviar a atenção do povo sobre o que importa, interessa menos qual a posição política do super-vilão e mais a necessidade de criar uma narrativa crível. Para assim esconder o que realmente está acontecendo por detrás da fumaça do mito de um supervilão. Não importa que até outro dia, o super-vilão tenha sido um aliado da grande mídia, que passa a condená-lo. O que importa é que agora ele é descartável ou inimigo.
De repente, todas as corrupções de Temer, escondidas por décadas, começam a aparecer. Estão já tratando a prisão de Temer como fato consumado no próximo mês de janeiro. Talvez ele seja “preso” com as mesmas regalias de Cunha. E Marcela Temer esteja sujeita às mesmas “revistas íntimas” a que a Sra. Eduardo Cunha “está sendo submetida” (sic). I.e., segundo o cartel midiático.
De qualquer forma, por mais privilégios na “cadeia” que estejam sendo prometidos a Temer, não é uma situação nada confortável e segura para um velho político acostumado com o luxo e a bajulação. Até mesmo a suposta promessa de asilo em Miami não é uma certeza ao longo do tempo, dependendo – a todo instante – da conveniência dos EUA.
De qualquer forma, Temer sozinho não resolve o problema de sempre ter de existir um supervilão para distrair as pessoas do que realmente importa. Uma vez preso Temer, outros terão que seguir seu caminho. E nada melhor do que focar no “sindicato” dos super-vilões.
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“Destrua o MDB!”
Ciro Gomes disse que, se eleito, iria “destruir o MDB”.
Mas ele não vê contradição em, ao mesmo tempo, procurar apoio do PP e do DEM, partidos ainda mais à direita do que o MDB. E ambos com problemas maiores com a Lava-Jato (ao menos o PP, porque o DEM é braço direito do protegido PSDB) e que votam mais afinados com o governo Temer do que seu próprio partido.
Não há dúvidas de que isso seja uma hipocrisia demagógica. Ele busca pegar carona na mídia, que elegeu seu novo “sindicato dos ladrões”.
Nesse caso, Ciro, Bolsonaro, Alckmin e os generais que gostam de Twitter estão com discursos parecidos. Todos eles pegando carona no diversionismo de culpar o MDB por tudo o que acontece no país e desviar a atenção da destruição da economia, dos direitos, da democracia e da incrível popularidade do maior preso político do país.
Destruir o MDB, na verdade, será só um teatro que não muda nada.
Vão pegar Temer e mais uns três e o resto do partido vai mudar de legenda indo para o partido do novo presidente e seus aliados mais próximos. Isso para manter o país exatamente igual. Os partido de direita sempre mudando de siglas e os partidos de esquerda sempre mudando de sentido.
(Aqui, link para a Parte 2)
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[1] Gustavo Galvão é economista pela UFMG, doutor em economia pela UFRJ, funcionário do BNDES, assessor parlamentar e comentarista de economia do Duplo Expresso.
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