Petróleo cita Mark Twain: “rumores sobre meu falecimento são ligeiramente exagerados”

O petróleo continuará sendo essencial para economia, a geopolítica, as guerras e os golpes de estado
Por Gustavo
Galvão[1]

O petróleo continuará tendo importância econômica fundamental no mundo por muitas décadas, mesmo depois que começar a adoção em massa dos carros elétricos, porque a energia fóssil ainda não tem um substituto para produção de energia elétrica. A energia nuclear é impopular e tem muitos problemas de segurança com riscos e custos elevados. Além das restrições militares e geopolíticas impostas pelos EUA e seus tratados desiguais. As energias renováveis, como vento e solar, são intermitentes, não entregam a energia de acordo com as horas de pico de consumo.

O petróleo continuará sendo a principal fonte de energia para o transporte por muito tempo. A frota de veículos movidos a petróleo continua crescendo no mundo graças a China e Índia. Não existe ainda nenhuma alternativa ao petróleo como combustível para aviões. Não existe ainda nenhuma alternativa ao petróleo como combustível para navios comerciais. Não existe ainda nenhuma alternativa ao petróleo em grande escala para os produtos plásticos.

O petróleo continuará sendo considerado de fundamental importância militar-estratégica. A tradição da história militar é que o controle sobre as reservas de petróleo foram fundamentais para vitória anglo-saxã na Primeira e, especialmente, na Segunda Guerra Mundial. Os alemães nunca tiveram acesso a fontes abundantes de petróleo. Um dos preparativos da Primeira Guerra foi a substituição de toda frota inglesa de navios a vapor para navios a óleo, porque possuem mais rapidez e agilidade. A Segunda Guerra foi uma guerra de tanques e aviões, altamente dependentes de petróleo. A famosa batalha de Stalingrado, que definiu os rumos da Guerra, é uma batalha pelo petróleo Russo do Mar Cáspio.

[Romulus Maya: sem esquecer que o verdadeiro causus belli para a Guerra no Pacífico não foi o ataque japonês a Pearl Harbor, mas sim o que o antecedeu e motivou: o embargo americano – então maior produtor e exportador – no suprimento de petróleo à máquina de guerra japonesa. A hipocrisia americana está muito bem refletida no episódio: “não esperava (sic) o ataque” japonês no que chamou de “dia da infâmia”, mas “fortuitamente” levara os porta-aviões mais modernos todos para “passear pelo mar” dias antes, bem longe do porto bombardeado]

Na chamada diplomacia estratégica, o bloqueio naval sobre fontes de petróleo é sempre uma arma diplomática e militar à disposição das potências navais. A China se sente vulnerável a essa arma.

O petróleo é o que torna o mundo inteiro dependente do dinheiro das finanças internacionais. A energia elétrica permitiria à maioria dos países fortes autossuficiência e independência energética, econômica e diplomática. O petróleo, não. Por ser praticamente a única fonte de energia para transporte no mundo, mesmo um país (não autossuficiente em petróleo) em grave crise econômica e com o consumo estagnado por falta de divisas ou que esteja buscando reduzir ao máximo suas importações não pode prescindir de ter que gastar grandes montantes de sua receita de exportações ou reservas com a chamada “conta petróleo”. Assim, o petróleo é um dos principais fatores que mantêm os países vulneráveis vinculados ao FMI e ao sistema financeiro internacional.

Mas, após 2025, vai começar a adoção em massa dos veículos elétricos. Isso fará com que o preço do petróleo comece a cair, porque o preço de venda das outras fontes de energia é pelo menos duas ou três vezes mais barato do que o petróleo.

O monopólio do petróleo como fonte energética para os automóveis é o que faz com que seu preço seja muito elevado. Como a produção de petróleo é cartelizada e seus consumidores, os motores a combustão em veículos de transporte, não têm outra fonte alternativa, o preço do petróleo é fixado em valores muito superiores às energias usadas para produção de eletricidade. Em razão desse preço abusivo, o petróleo é a principal fonte de excedentes, mais-valia, no mundo. Estima-se que que o petróleo produza anualmente 3 trilhões de dólares de mais-valia, lucro e impostos sobre lucros no planeta.

Com a chegada do carro elétrico, exceto para aviões e navios, o petróleo terá que concorrer com as outras fontes de energia em seu principal mercado consumidor, o transporte urbano e rodoviário.

Apesar da tendência de o carro elétrico reduzir o excedente, ou mais-valia do petróleo, para os próximos 7 anos, sua importância estratégica e diplomática vai perdurar por décadas e no curto e médio prazo ainda teremos a tendência de aumento do preço do petróleo. Uma das razões é a revolução do óleo de xisto que parece que será apenas uma revolução americana. Ou seja, só tem se mostrado econômica e politicamente viável nos EUA, onde a regulamentação ambiental é uma das mais frouxas do mundo, apesar de eles cobrarem rigidez ambiental nos outros países. De qualquer forma, a revolução americana do óleo de xisto parece que já se estabilizou mesmo lá. O consumo de petróleo continuará crescendo por causa do aumento da frota de China e Índia, ao menos até o meio da próxima década em razão da ainda baixa velocidade de adoção dos automóveis elétricos.

O Brasil, a Costa Ocidental da África, Líbia, Venezuela e provavelmente Rússia e Irã parecem ser as únicas fontes de crescimento da produção de petróleo no mundo. Em todo o resto do planeta a produção está decrescente em função do esgotamento das reservas.

Por isso, esses foram alvos recentes de guerras e golpes de estado. Tendo em vista o horror que impuseram à maioria desses países, se o povo não reagir por aqui, podemos esperar no próximo mandato presidencial uma crise muito pior do que a que estamos vendo no governo Temer. Podemos chegar ao ponto de sofrermos uma verdadeira crise humanitária com redução brutal da expectativa de vida, se o povo continuar inconsciente do que está realmente acontecendo através da manipulação midiática. O ódio artificial que criaram, na melhor das hipóteses, só produzirá miséria se não for revertido.

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P.S.: o autor pede para acrescentar a recomendação de leitura de “the rape of Russia“, publicado no indispensável The Saker.

[1] Doutor em economia, economista do BNDES licenciado, assessor parlamentar e comentarista do Duplo Expresso.

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Romulus Maya

Advogado internacionalista. 12 anos exilado do Brasil. Conta na SUÍÇA, sim, mas não numerada e sem numerário! Co-apresentador do @duploexpresso e blogueiro.

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