Eleições na Bolívia: quem venceu e quem se movimenta por detrás?
Alejandro Acosta (comentários de Romulus Maya via Facebook)
Ainda sem todos os votos terem sido contabilizados, o que devia ter demorado dois dias, foi anunciado que Luis Arce, o candidato do MAS (Movimento ao Socialismo) de Evo Morales, venceu as eleições de lavada, com mais de 52% dos votos.
Obviamente, essa “vitória acachapante” só pode ter acontecido com a bênção da direita e da Embaixada dos Estados Unidos; havia a necessidade de baixar a temperatura social, até para evitar mais um foco de contágio latino-americano.
No Chile, os protestos foram retomados. No dia 18 de outubro, fez um ano do estouro social que começou no ano passado.
O que representa a vitória do MAS?
Luis Arce integra a ala direita do MAS. Ele foi ministro da Economia de Evo Morales.
Há um golpe contra a direita e uma vitória popular, embora que bastante relativa, já que Arce é uma espécie de Lenín Moreno (Equador).
Essa ala aliada a mais duas alas do MAS (são cinco principais) foram cúmplices do golpe.
O MAS até ficou com a maioria na Assembleia Plurinacional e permitiu e colaborou com o governo de extrema direita, encabeçado pela autoproclamada presidente, Jeanine Áñez.
Após o golpe de Estado, uma parte importante do MAS saiu às ruas e promoveu enfrentamentos importantes com as forças repressivas (que foram mantidas intactas pelos governos de Evo) e com os grupos fascistas, principalmente os ligados a Camacho (do Departamento de Santa Cruz) e à própria Jeanine Áñez. Um pouco antes disso acontecer, Evo Morales e seu vice, Liñera (o ex guerrilheiro arrependido e “pai” do “indigenismo”), renunciavam em público para “evitar um derramamento de sangue”, depois de terem sido pressionados pela cúpula do Exército e da COB (Central Operária Boliviana).
Os principais setores da direção do MAS seriam o equivalente da nossa “Esquerda” Bolsonarista (que ajuda o Governo Bolsonaro a massacrar o Brasil), mas com algumas diferenças.
A Bolívia é um dos países da América Latina onde as contradições são maiores. O MAS, à diferença do PT, sim tem influência de massas real e pela base, inclusive nos sindicatos.
O golpismo e o fascismo devem ser derrotados nas ruas
Após uma série de capitulações, a de Evo Morales, a de Álvaro García Liñera, e de toda a direção do MAS (Movimento ao Socialismo), o povo boliviano foi deixado nas mãos das forças armadas golpistas e das hordas fascistas. A traição foi tão grande que toda a cúpula do MAS renunciou até ter sobrado a segunda vice-presidente do Senado, Jeanine Áñez, de extrema direita, que mantém conhecidas ligações com o narcotráfico e que acabou assumindo a Presidência da República.
O povo boliviano, que tem enorme tradição de luta, reagiu a partir de confrontos espontâneos que aconteceram em El Alto. Os golpistas foram contidos, mas o povo pagou um alto preço com derramamento de sangue.
O papel do MAS tem sido de conciliar e de “chamar novas eleições”, que obviamente irão impor um governo teleguiado, diretamente, pelo imperialismo norte-americano. Evo Morales, já na segurança do México, declarou que voltaria para “apaziguar” o povo e, depois, pediu para o Papa intervir.
Apesar das organizações de massas terem mobilizado os trabalhadores, até por medo de serem ultrapassadas, rapidamente aderiram à capitulação da cúpula do MAS. A Conalcam (Coordenadora Nacional pela Mudança), que agrupa movimentos sociais ligados ao MAS, levou reivindicações ao Ministro da Presidência de Jeanine Áñez, Jerjes Justianiano, o que equivalia a um reconhecimento direto do governo golpista, mesmo sendo um governo interino. A burocracia da COB (Central Operária Boliviana) se reuniu com o mesmo Sr. Justiniano e acordou uma Mesa de Diálogo. Os deputados e senadores do MAS que não fugiram se reuniram novamente e fizeram com que o parlamento voltasse a funcionar, respeitando o novo poder executivo golpista.
Há três políticas principais colocadas na Bolívia, a do imperialismo, a do MAS e a dos trabalhadores. A política imposta pelo imperialismo norte-americano, que implica em sugar até a última gota de sangue dos bolivianos, conta com os agentes diretos da direita infiltrados nos departamentos da chamada Meia Lua, com as hordas fascistas e com as Forças Armadas, porque agora ficou muito claro que essas respondem aos interesses do imperialismo. Uma questão básica é que a sucessão de capitulações de Evo Morales e do MAS já mostraram que o imperialismo busca reduzir, ao mínimo, a margem de manobra porque, dado o aprofundamento da crise capitalista, precisa manter as grandes empresas funcionando, arrancando o couro das massas.
A esquerda oportunista não entende, até pela condição pequeno-burguesa, que o período de concessões do imperialismo ficou para trás, que agora é lutar ou morrer. E isso vale para a burguesia imperialista, que precisa salvar este regime caduco, e para os trabalhadores, que precisam enfrentar a fome e lutar pela própria sobrevivência.
O caminho sem volta do oportunismo
O MAS (Movimento ao Socialismo) de Evo Morales se fortaleceu, na primeira parte da última década, na luta contra os governos “neoliberais” que estavam explodindo a Bolívia, embora sempre buscando conter a radicalização do movimento de massas. A base social sempre foi camponesa, principalmente os cocaleiros indígenas.
Ao assumir o cargo, em 2006, convocou uma Assembleia Constituinte, mas obteve pouco mais da metade dos votos, impedindo-o de realizar as reformas prometidas. Ele foi forçado a se reconciliar com a direita, que por meio de uma série de manobras acabou implodindo as grandes nacionalizações. Com o contágio da crise capitalista de 2008, Evo perdeu o apoio do COB e de três organizações indígenas.
Nesse contexto, a ala esquerda da burocracia sindical mineira começou a construir o IPT, o Instrumento Político dos Trabalhadores. A partir de 2013, com o aumento dos preços do estanho, Evo conseguiu apertar o controle do IPT e da esquerda da burocracia sindical por meio de diversos mecanismos. As lideranças do COB, praticamente todas as lideranças dos CODs (Central Obrera Departamental), assim como as lideranças das organizações camponesas, passaram a apoiar o Governo e o MAS.
A partir de 2016, com o aprofundamento da crise capitalista mundial e o endurecimento do imperialismo contra os governos nacionalistas, a situação na Bolívia se deteriorou e a direita se fortaleceu. Nas últimas eleições nacionais, Evo ignorou o resultado do referendo que o impedia de disputar o quarto mandato e o pior é que o resultado foi de pouco mais de 10% dos votos necessários para evitar ir ao segundo turno, a menor diferença desde 2006. Foi o suficiente para a operação de desestabilização intensiva.
Lições do golpe na Bolívia
O imperialismo está em uma crise gigantesca e precisa estabilizar os lucros dos monopólios. E muito rápido.
A gigantesca desestabilização do Chile criou um grande problema para o governo Trump, já que o colapso da “queridinha” do grande capital da América Latina poderia ter um grande efeito de contágio em toda a região, começando pela Argentina, Brasil, Colômbia, Peru e México.
O papel das Forças Armadas e da polícia, que continuaram a manter vínculos com o imperialismo, revela que, na atual fase política, tendem a ir para a direita quando o imperialismo aumenta a pressão. Rachaduras e conversões à esquerda só podem ocorrer em estágios de ascensão revolucionária.
A retirada da Alemanha do acordo para explorar o lítio boliviano e cooperar no desenvolvimento de uma indústria local, revela que o imperialismo europeu também está longe de ser um aliado confiável para a burguesia local. O mesmo se aplica ao eixo da China e da Rússia.
A recusa em quebrar a mobilização fascista nas ruas e o golpe de Estado de direita revelam, mais uma vez, a enorme limitação dos atuais nacionalistas latino-americanos que estão a anos-luz de Salvador Allende.
O imperialismo tem uma política regional: massacrar a América Latina a partir do modelo capacho, o Brasil. Para isso busca impor o Evangelistão do Pó (em acelerado andamento), o Patriot Act Tabajara (em acelerado andamento com o apoio da “Esquerda” Bolsonarista) e o Banestado 3.0 (com o apoio entusiasta da mesma “esquerda”). Dessas questões iremos tratar, em 12 capítulos, na Série “O Doleiro”.
O centro da luta revolucionária deve ser a luta contra o imperialismo e seus serviçais locais. Por um governo revolucionário dos trabalhadores que levante as bandeiras que a “Esquerda” Bolsonarista, no Brasil, jogou na lata do lixo.
No caso do Brasil, é preciso levantar estas bandeiras para evitar o massacre da nação brasileira. Leia mais aqui: http://www.gazetarevolucionaria.com.br/index.php/politica/1438-eleicoes-2020-2
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