Facebook – O furo no olho da usura

Por Wellington Calasans, para o Duplo Expresso

O recente escândalo sobre como a Cambridge Analytica teria usado dados pessoais de usuários do Facebook tirou esta plataforma da cômoda posição de empresa de integração de pessoas e jogou-a na sua mais séria crise desde que foi criada. O estrago é grande, pois provoca sério risco ao único conceito de negócio sustentável da empresa.

Sabemos o que é o Facebook? O seu fundador, Mark Zuckerberg, sempre pareceu seguro para responder de forma objetiva a essa questão. No entanto, após a avalanche de problemas, ainda em curso, decorrente do uso indevido de informações dos usuários, um dos maiores desafios é recuperar a credibilidade.

Para tirar ainda mais o sono de Zuckerberg, o Facebook e outras grandes empresas da internet foram convocados para uma reunião esta semana em que o governo sueco exigirá que conteúdo odioso e abusivo seja removido. Longe de ser censura, os suecos exigem que mensagens com esse tipo de conteúdo sejam inibidas, pois são, de alguma forma, favoráveis ao Sverigedemokraterna (Partido de Ultra Direita).

O ministro sueco da Justiça, Morgan Johansson,  afirmou ao jornal Expressen que “no início, quero diálogo e auto-suficiência”. Os suecos sabem que não é possível controlar o que impulsiona o Facebook. A plataforma é um ecossistema com muitos atores: não apenas o próprio Facebook, mas também todos aqueles que desenvolvem aplicativos e conteúdos que interagem com esta plataforma – e, acima de tudo, o público, empresas e organizações responsáveis pelo consumo e produção reais do conteúdo. Por isso, há ameaça de abandono desta rede social pelos governos da Suécia e outros países europeus. 

Zuckerberg e seus dirigentes mais próximos parecem meio perdidos diante dos atuais problemas. Prova disso é que em 2015, por exemplo, Zuckerberg cogitou deter o controle sobre o crescente mercado de streaming de vídeo ao vivo. Fez disso a prioridade absoluta da empresa ao longo de dois anos, mas hoje mantém absoluto silêncio sobre o assunto.

A última redação da visão corporativa foi publicada através de um post na página do Facebook de Zuckerberg em janeiro, em conjunto com as mudanças reescritas de algoritmos que controlam o que aparece no feed de notícias. Lá ele escreveu sobre a frustração de como a plataforma foi abusada, em campanhas de ação, propaganda e propagação de “falsas, sensacionalistas e argumentações polarizadoras”. Ele escreveu sobre a necessidade de assumir a responsabilidade, para garantir que o Facebook seja usado como o planejado: “conectar pessoas de uma maneira que não seja apenas divertida, mas também boa para a sociedade”. O termo “bom para a sociedade” foi repetido várias vezes no post.

Difícil acreditar na pureza do Facebook no trato dos dados do usuário. Sobretudo após compartilhar dados com anunciantes e desenvolvedores, através de um sistema próprio no qual eles transmitem contato entre diferentes partes interessadas e os grupos-alvo específicos que desejam alcançar e influenciar.

Superar a desconfiança do usuário é o desafio maior desta empresa que, segundo a Forbes, é a décima maior de tecnologia do mundo, tem 2,1 bilhões de usuários por mês, 1,4 bilhão de usuários todos os dias e publica cerca de 7 bilhões de postagens e comentários diariamente.

Não é apenas o Facebook que faz isso: a cultura de vigilância é a força vital de todo o ecossistema digital. Mas o Facebook e o Google inventaram a sistemática atual para ganhar dinheiro – 99% das receitas do Facebook provêm da publicidade direcionada ao público – e agora podem perder tudo graças ao abuso no uso de dados pessoais por muitos anos.

A exigência de todos os usuários é que o acesso aos dados privados deva ser drasticamente restrito àqueles que desenvolvem serviços para a plataforma. Mas também significa, é claro, que a rede social se torna menos interessante, o que puxa o tapete da lucratividade.

O certo é que desde que a Cambridge Analytica passou a usar essas informações para a microssegmentação e campanha política em escala gigantesca – talvez não teria sido uma ambição do Facebook – provocou um efeito colateral inevitável ao modelo de negócios.

Existe outro modelo de negócios possível? O Facebook pode se tornar uma plataforma pela qual você paga, como membro, para garantir um ambiente digital mais saudável? Alguns debatedores agora falam calorosamente em favor dessa opção. No entanto, seria contrário ao que é dito quando você faz logon na plataforma: “O Facebook é gratuito e sempre será”.

Com a palavra, Mark Zuckerberg.

Fontes: DN/SVD/SVT/SR

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Romulus Maya

Advogado internacionalista. 12 anos exilado do Brasil. Conta na SUÍÇA, sim, mas não numerada e sem numerário! Co-apresentador do @duploexpresso e blogueiro.

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