Monica de Bolle (2): “não sabe brincar, não desce pro playground”
Comentários aos post “Agora vai! “Jurisconsulta” Monica de Bolle prova por A + B que tem SIM crime no impeachment”.
– Crítica objetiva e desapaixonada abaixo, de Ciro D’Araújo, que teve contato com Monica. A crítica de Ciro, bem elaborada, prima pela ponderação e pela empatia pela criticada.
– Tudo o que faltou a Monica no seu vídeo-pearecer maniqueísta e pretensioso.
– Direito a opinião todos temos. Direito de criticar as alheias também, Monica!
– Pena que paixões e suscetibilidade excessiva à crítica a levaram a bloquear a minha Chihuahua de estimação, a Maya Vermelha.
– Não apenas isso: bloqueou diversas pessoas que compartilharam o post nas redes sociais.
– Monica: você sendo do Rio de Janeiro, como eu, certamente conhece o ditado que dá título a este post, repetido pelos pais a crianças que sabem bater mas não sabem apanhar, quando se aventuram em suas primeiras interações sociais em sua vizinhança – longe do olhar protetor dos pais.
– Apesar de metáfora usando crianças, vale para adultos também.
– Especialmente aqueles que se aventuram na arena pública e, como você e eu, na academia.
– Monica, também bloqueou quem a criticou em bancas de mestrado e doutorado?
Ao comentário de Ciro D’Araújo, que, além da análise do episódio, ainda brinda os leitores com exemplos históricos para que tracemos paralelos:
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Tive bastante contato com a Mônica uns 20 anos atrás. Sempre foi uma economista honesta dentro da ortodoxia econômica vigente. Foi uma boa professora (ou foi monitora, não lembro agora) de macroeconomia.
Tudo que ela diz é, de fato, correto. Há de certa forma fraude. Só que a conclusão de que fraude contábil é crime (e crime de responsabilidade ainda por cima) acontece por conta dela e não por conta do direito.
O mesmo tipo de fraude contábil foi usada por exemplo pelo governo Obama para passar por cima de um congresso republicano que se recusava a autorizar aumento de gastos necessários. Decretos de suplementação orçamentária, etc… E nesse caso o presidente democrata foi elogiado pelo establishment econômico por não ceder ao “legalismo” do congresso que desejava paralisar o país.
Agora voltando ao direito, que não é nem de longe minha especialidade, mas os cursos de introdução ao direito que me foram dados me explicaram bem claramente que não existe um crime sem uma lei que o tipifique.
Por exemplo, eu acho homofobia uma atitude criminosa, imoral, hedionda, vai tudo contra o que eu acredito e contra todos meus valores. Mas, infelizmente, não é crime. Não foi tipificada como crime pela legislação.
E por isso, o deputado Bolsonaro não pode ser denunciado pelo crime (inexistente) de homofobia.
Essa é uma das questões fundamentais. Esta em risco não apenas os resultados, mas as regras do jogo. No momento em que não há segurança jurídica nem mesmo para o mandato do chefe de estado do país, como haverá segurança jurídica para qualquer outra coisa?
E vemos STF discutindo se a dívida dos estados pela “Selic acumulada” (conforme previsto nos contratos) se trata de juros simples ou compostos. Quando basta dar um google em “selic acumulada” para ver que é consensual que se trata de juros compostos.
Tenho certeza que a Mônica acha os malabarismos fiscais feitos algo imoral, repreensível e, de fato, criminoso e que Dilma merecia perder o mandato por apenas esses fatos. Tendo conhecido ela, essa é sua visão honesta, sem hipocrisia.
Porém resta o pequeno detalhe de que 1) Isso é crime? 2) Sendo crime, isso é crime de responsabilidade?
Sobre essas questões, nem eu nem Mônica temos condições reais de responder. Ela talvez devesse dizer: “Isso deveria ser crime e ser crime de responsabilidade”. Porém outro dos princípios do direito é que uma lei não pode retroagir. Ou seja, o crime só existe depois de estar tipificado na legislação.
A inovação do impeachment de Dilma como pelo “conjunto da obra” é algo preocupante. Ele viola o princípios do presidencialismo ao gerar uma espécie de voto de desconfiança parlamentar sobre não apenas o chefe do governo, mas sobre o chefe do estado. Não é nem mesmo um recall (que existe em diversos sistemas constitucionais), mas sim uma deposição por desconfiança do parlamento.
Deve-se lembrar dos processos de impeachment realizados nos EUA. Primeiramente o de Andrew Johnson que foi vice presidente e assumiu por ocasião do assassinato do Lincoln. Eleito numa chapa entre republicanos e democratas dissidentes, ele não tinha apoio nem no congresso nem no Senado nem na suprema corte com maiorias amplas de republicanos. Quebrou compromissos de campanha e para remove-lo o congresso passa uma lei fragrantemente inconstitucional para força-lo a quebra-la e daí sair o processo de impeachment. Só depois dele quebrar tal lei (o tenure of office act) é instaurado o impeachment e o resultado foi sua absolvição no senado por um único voto. Terminou o mandato, mas é lembrado como um dos, senão o pior, presidente americano de todos os tempos.
Já no bizarro impeachment de Bill Clinton, processo eminentemente político, a discussão congressual pública se baseava inteiramente em argumentos jurídicos. A questão passa de “Ele mentiu sobre fazer sexo?” e gerou a constrangedora discussão sobre quais os limites do que é definido legalmente como sexo. Foi um show de horrores da hipocrisia americana. Mas nenhum deputado falava sobre sua política fiscal ou sobre a política econômica durante o processo.
É necessário manter o mínimo de segurança jurídica. E sendo o Brasil o segundo maior país presidencialista do mundo, o que acontece aqui pode influir no futuro não apenas do Brasil mas de muitos outros países.
Preservar as regras do jogo muitas vezes é mais importante do que o resultado imediato do jogo em questão. Só isso pode garantir que resultados futuros também sejam preservados.
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