Debate trágico: polêmica do aborto em caso de microencefalia, por Romulus
Debate trágico: polêmica do aborto em caso de microencefalia
Por Romulus
A decisão do procurador-geral da República de estender o aborto legal às gestantes contaminadas pelo Zika vírus é “discriminatória e preconceituosa”, beirando a ideia nazista de atingir a perfeição. Essa é a avaliação do jornalista Marcelo Auler, que publicou um artigo, nesta sexta (9), abordando o tema – em consonância com artigo de Luis Nassif, no GGN, sobre o mesmo assunto.
Prezo a opinião do Nassif e do Auler (links abaixo).
Mas discordo.
Permitir o aborto não é torná-lo obrigatório.
Aqui, apenas se faculta à mãe pobre aquilo que a rica e a de classe média já fazem nas clínicas particulares.
Já ouvi – inclusive – relato de amiga de amiga médica que recorreu ao aborto em clínica particular depois de exame de aminiocentese detectar o problema da microcefalia.
Sou favorável à descriminalização do aborto – como ocorre em todos os países mais avançados.
Não é porque o problema como um todo não é resolvido que não se pode tentar resolver uma parte.
“Se não pode todo o aborto então não pode nenhum aborto!”
Discordo: não sou daqueles que usa esse tipo de raciocínio como álibi.
Daqueles que dizem, por exemplo, que é “supérfluo discutir ‘perfumarias’ como machismo, meio ambiente, homofobia, maus tratos a animais, ‘enquanto tem tanta criança na rua e tanta fome no mundo’ ”.
Álibi para a inação, que pode ser reduzido à máxima: enquanto não se resolver tudo, que não se resolva nada.
Se aborto de deficiente é “eugenia e nazismo”, então toda a Europa Ocidental é hoje nazista.
Sim, porque na Europa Ocidental os países permitem aborto de feto com trissomia do cromossomo 33 – síndrome de Down – até depois do prazo legal de 3 meses da autorização geral para o aborto. Ou seja, no caso de síndrome de down o prazo é maior.
Não fosse assim, num continente onde não raro as mulheres têm filhos entre 40 e 50 anos, a proporção de crianças com síndrome de down seria algo já próximo ao quê? 1 em 10? 3 em 10?
Perguntemos aos médicos, mas é algo por aí, dado o aumento exponencial da probabilidade a partir dos 37 anos da mulher.
Não busco com isso eliminar o dilema moral!
É sim eugenia.
Eu mesmo nunca, nunca mesmo, queria estar submetido a esse dilema e ter essa possibilidade de escolha entre vida e morte.
Mas não é porque não tenho resposta ou porque tenho uma diferente que devo tentar impô-la a outros.
Por que submeter uma família – e uma criança! – a uma existência miserável de desamor mútuo?
Não haverá de ser a possibilidade de aborto que aumentará sobremaneira a estigmatização da criança com deficiência, além daquela que já existe e que deve ser combatida com toda a força.
Na analogia mais próxima que consegui encontrar:
O aborto – legal ou clandestino – aumenta muito a estigmatização de filho “normal” de mãe adolescente? De mãe pobre “com uma penca de filho que abusa do bolsa-vagabundagem”?
*
Que se escrevam muitos artigos sobre a riqueza que é ter um filho com síndrome de down, sobre esses serezinhos que incarnam o amor e o afeto em estado bruto e a ausência de malícia, sobre o avanço na cidadania dos jovens e adultos com down, etc.
Tenho na família, inclusive, parente com filho down. Assim como autista.
Falo em down porque não posso descrever a criança com microcefalia, ainda desconhecida.
*
Tenho muitas críticas a Janot.
Muitas mesmo.
Mas tentar estender à mulher pobre o “direito” já exercido pela rica e pela classe média ao aborto – ainda que de forma muito limitada – não é uma delas.
* * *
Por Marcelo Auler
Janot: aborto não deve ser crime, mas não pode servir à eugenia
*
Procurador Janot e a eugenia para crianças com deficiência
* * *
(i) Acompanhe-me no Facebook:
Maya Vermelha, a Chihuahua socialista
(perfil da minha brava e fiel escudeirinha)
*
(ii) No Twitter:
*
(iii) E, claro, aqui no GGN: Blog de Romulus
*
Quando perguntei, uma deputada suíça se definiu em um jantar como “uma esquerdista que sabe fazer conta”. Poucas palavras que dizem bastante coisa. Adotei para mim também.
Facebook Comments