Democracia e Ditaduras No Cardápio Eleitoral

Por Pedro Augusto Pinho*, para o Duplo Expresso

Uma questão está colocada por analistas políticos e jornalistas que não conseguem entrevistar o candidato mais votado no primeiro turno da eleição presidencial: qual a razão desta fuga?

É sobre esta questão que tentarei dar uma resposta.

Qual Projeto Será Vencedor

O Capitão, como todos já perceberam, não é pessoa preparada, ao contrário, diríamos que é bastante tosco, desconhece questões relativamente simples de economia e direito. E após mais de 20 anos como parlamentar, o que demonstra seu descaso pelo conhecimento, pela dedicação ao próprio trabalho.

Juntaram-se a ele, nesta eleição, dois grupos de interesses, buscando dominar o futuro do Brasil.

Um, que trato em diversos artigos, é o sistema financeiro, a banca. Um projeto de poder global, de ideologia neoliberal. Seu representante no grupo Bolsonaro é o economista Paulo Guedes, a quem o candidato chamou de “Posto Ipiranga”.

Mas temos observado que ora o “Posto” é desmentido pelo candidato, ora se apresenta, como seu porta voz, em reuniões fechadas de “financiadores”.

O segundo grupo, embora nacional, também tem amarras no exterior. É uma consequência do sistema colonial sempre vigente, desde o descobrimento, no Brasil. Denomino-o “jurídico-militar”.

É um projeto de apropriação do Estado para usufruto de alguns estamentos, onde ressaltam o jurídico (magistrados, promotores, procuradores, defensores públicos, delegados) e o militar. Não há um representante, mas os principais membros são o candidato a vice-presidente, General Hamilton Mourão, o General Sérgio Westphalen Etchegoyen, representando o atual governo de Michel Temer, o General Augusto Heleno Ribeiro Pereira, uma espécie de Papa Negro (o superior jesuíta, por muitos anos a maior influência no Vaticano) e o Ministro José Antonio Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), que nomeou o General Fernando Azevedo e Silva seu assessor, para a interligação jurídico-militar.

Este grupo tem, apenas, o projeto pessoal e classista de manter a apropriação dos recursos públicos, com privilégios, vantagens e benefícios, tributários, salariais, financeiros, e de toda ordem, como as elites sempre o fizeram no Brasil. E ainda falam de corrupção!

Estes dois grupos ainda não sentaram à mesa para repartir o butim chamado Brasil. Daí a dificuldade de Bolsonaro enfrentar uma equipe de jornalistas, a não ser os amestrados e disciplinados aliados, e, principalmente, debater com seu adversário.

Como responder, por exemplo, o que fará com a Embraer? Os interesses são conflitantes. A banca quer colocá-la nos ativos da Boeing (Pentágono). Já o  estamento jurídico-militar vê os cargos e as comissões que a empresa lhes proporcionaria.

Consequências de um Grupo Prevalente

Podemos fazer cenários. As realidades são as nuvens do ardiloso político e banqueiro Magalhães Pinto, ora estão de um jeito, ora de outro.

Partimos de uma situação que é vista como inevitável nos próximos dois anos: a 14ª crise, desde que a banca assumiu o poder financeiro-econômico-político-midiático no mundo.

Esta crise é prevista por economistas do ATTAC (Associação pela Taxação das Transações pela Ação Cidadã), um grupo contra a banca, e pelos servidores da banca no Fundo Monetário Internacional (FMI).

No Brasil, já fragilizado pelas ações do Governo Temer e pelas ações parlamentares e da própria Dilma Rousseff, em seu segundo e incompleto mandato, com reservas em dólares estadunidenses, que deverão ser desvalorizadas no curso da crise, com qualquer dos dois grupos no comando da Nação, só poderá naufragar. Antevejo ondas de desempregados e saques e violência urbana aumentando. Uma insegurança de toda ordem: pessoal, patrimonial, jurídica, econômica e social. Pois, como ficou óbvio, nenhum dos litigantes no campo do Bolsonário tem projeto para a Pátria Brasileira.

Ambos grupos e, na verdade, toda esta campanha eleitoral, com a exceção do candidato Ciro Gomes, discutiram violência, sexo, ideologia, corrupção, tudo que não fosse a Questão Nacional, a Soberania do Brasil.

Chegaremos desguarnecidos a esta crise. Observe, o caro leitor, que, praticamente, tivemos uma crise a cada dois anos de dominação da banca (1990-2018). Elas são necessárias para a concentração de renda.

Como lhe rouba a banca

Façamos breve pausa nesta análise eleitoral para entender uma das ações da banca. Como é evidente, são ações financeiras, uma vez que é a própria área de sua especialização.

Uma determinada instituição financeira (lembremos as desregulações dos anos 1980) cria vinte fundos de captação de recursos das pessoas, físicas e jurídicas.

Para o Fundo Um, o mínimo de aplicação é 500 milhões de dólares; para o Fundo Dois, o mínimo baixa para 200 milhões, o Fundo Três, 100, até o Fundo 20, para o qual não há valor mínimo. Nas crises, os aplicadores dos Fundos 10 a 20 perderão tudo ou percentuais decrescentemente variáveis, que servirão para incrementar os ganhos, também diferenciados, dos aplicadores nos Fundos 1 a 9. Chama-se concentração de renda e é um dos objetivos da banca.

Com estas captações, muitas originadas de paraísos fiscais, os fundos chegam a acumular vários PIBs brasileiros, hoje o 9º do mundo.

Acima de um trilhão de dólares temos oito empresas: BlackRock (4 trilhões), State Street (2), Allianz (2), Vanguard (2), Fidelity (1,8), J.P.Morgan (1,4), BNY Mellon (1,3), Amundi (1). Com estas fortunas os grupos tornam-se os donos ou principais acionistas de todas empresas multinacionais: ExxonMobil, Shell, Chevron, Unilever, Colgate-Palmolive, Coca-Cola, Nestlé, GM, Ford etc.

Após a crise, você que tem apenas seu salário e colocou, com sacrifício, um pouco dele em um fundo, estará mais pobre. Por outro lado, a família real inglesa, os Windsor (ex Saxe-Coburgo-Gota), uma das maiores fortunas do mundo, estará mais rica.

É a consequência dos governos da banca. Transferir dinheiro dos mais pobres – pessoas ou países – para os mais ricos.

Estamento jurídico-militar

Pode parecer estranho que não tenha tratado da mídia. Esta tem e sempre teve influência decisiva no que denomino pedagogia colonial, em outras palavras, na formação de seu conhecimento, seu pensamento e de seu raciocínio.

É que a mídia brasileira também tem interesses conflitantes. Veja o caso do Sistema Globo. Sempre aliado da elite brasileira, por sua vez, pelo modelo agrário exportador, majoritário em sua formação, também dependente do exterior. Há alguma identidade de propósitos entre estes 1% de brasileiros e a banca.

No entanto, como no exemplo acima, poucos, na verdade nenhum é  investidor do Fundo 1. No melhor, estarão nos Fundos 8 ou 9, de menores ganhos, ou até dos 10 ou 11, das menores perdas. A Globo assim se posiciona. Também a Record, do Bispo Macedo, apoiadora do Capitão.

Vemos portanto um conflito que se explicita em afirmações ou interrogações dos âncoras, comentaristas ou repórteres destas emissoras.

O estamento jurídico-militar é majoritariamente de classe média, dos capitães-do-mato, um ou outro, pouquíssimos, estão no 1% da elite dominante, voltadas para o exterior.

É esta promoção o maior incentivo deles, daí serem os corruptos mais facilmente identificados, como os parlamentares, magistrados (juízes e desembargadores), promotores e empresários, frequentemente citados em delações.

Os banqueiros, por outro lado, não frequentam a lista da corrupção, como se o dinheiro, que circula em suas mãos, tivesse recebido absolvição e indulgência plenária.

Ambos grupos, banca e estamento jurídico-militar, esperam a ditadura, já a estão formando com os “fakes” pós eleitoral, caso seu candidato seja escolhido. Na democracia suas ações sempre podem e, certamente, serão conhecidas e divulgadas. Principalmente pelas comunicações virtuais, que, em meu cenário, serão prioritariamente atingidas.

Oposição

Denomino “Oposição” pois o Brasil é hoje dirigido pelo Consórcio Banca-Estamento Jurídico-Militar. Como já antecipei, não entrou nesta campanha a Questão da Pátria Brasileira.

O que propõe, então, o candidato Haddad?

Apenas, e nem é pouco, manter ou reviver a democracia. Daí certas dificuldades em se pronunciar sobre o governo onde estarão, provavelmente, representantes de muitas forças, até as que formaram oposição a seu partido.

Poderíamos afirmar que é uma geleia geral. Mas o que é a democracia senão o  sistema que acolhe todos os contrários? Que aceita e inclui todos?

Seria mais do mesmo? Não creio. A sociedade também não é a mesma. Mas haverá um mínimo, como nos governos Lula, de avanço social. E os banqueiros, as elites voltadas para o estrangeiro, o estamento jurídico-militar continuarão atuando. As questões transversais também reivindicando espaço no poder, cidadania e reconhecimento.

E a formação da civilização brasileira mantendo seu projeto de nação plural.

Isto resolverá a questão da crise preparada pela banca?

Certamente não, mas poderá repatriar as reservas, antes que derretam, e usá-las na garantia de emprego e renda no Brasil. Poderá rediscutir as prioridades do Banco Central e proteger a economia, a indústria, o comércio e o agronegócio nacionais, deixando os multinacionais a cargo de seus donos.

Na democracia todas as opções podem ser colocadas à mesa, sem que seja necessariamente para divisão do espólio, do que restou após o tsunami da banca.

*Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado

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