Em defesa da Eletrobras, trabalhadores anunciam nova greve
Da Redação do Duplo Expresso,
O Duplo Expresso fez uma edição para que você possa assistir apenas ao exato momento da entrevista feita por Wellington Calasans e Romulus Maya à Diretora do Sindicato dos Urbanitários no Distrito Federal (STIU-DF), Fabíola Latino Antezana.
Numa explanação de quem domina o assunto, Antezana fez um “Balanço da greve contra a privatização da Eletrobras” e anunciou, com exclusividade para a nossa página, que uma nova greve está a ser preparada para que seja evitado mais um crime contra o patrimônio brasileiro, desta vez através do desmonte do sistema Eletrobras.
É mais uma classe trabalhadora que desafia o sistema em curso no Brasil e mostra que está forte e disposta a lutar.
Confira a entrevista!
Transcrição* de entrevista com a diretora do Sindicato dos Urbanitários do Distrito Federal (STIU-DF) Fabíola Latino Antezana no Duplo Expresso de 15/06/18
Wellington Calasans: Fabíola, bom dia. Bem-vinda aqui ao Duplo Expresso, é um prazer tê-la aqui outra vez com a gente
Fabíola Antezana: Bom dia. Tudo bem, Wellington? Obrigada pela oportunidade
Wellington Calasans: Tudo ótimo. Oportunidade é nossa de ouvir a sua palavra, de saber o que é que está acontecendo, qual o balanço que vocês fizeram da greve, né, de uma paralisação de três dias contra mais uma violência contra o patrimônio brasileiro, que seria essa privatização da Eletrobras.
Fabíola Antezana: Isso, exatamente. A gente fez agora, nos últimos dias 11, 12, 13 [de junho de 2018], uma paralisação de 72 horas contra a privatização do sistema Eletrobras, né? Um processo que está bem acelerado no âmbito do congresso nacional, um processo que foi fatiado em diversos projetos de lei para tentar facilitar a entrega de alguma parte da Eletrobras. A Eletrobras hoje, ela tem o segmento de geração, de transmissão e de distribuição, e tão logo o governo percebeu uma resistência muito grande da privatização da empresa e aí resolveu partir para o elo mais fraco, que é o segmento de distribuição.
Wellington Calasans: Pois é. Você sabe que teve aí uma juíza, né, que unilateralmente disse “Não, tem que privatizar”. Tirou da cartola assim sem… Como é que vocês vão trabalhar contra essa nova presidenta do Brasil aí, essa juíza que quer privatizar a Eletrobras?
Fabíola Antezana: (risos) Bom, na verdade, esse é o preço do golpe e é bem aquilo, é um golpe com tudo. Então, a gente não tem dúvida de que, no Judiciário, boa parte do Judiciário defende a privatização da nossa empresa, a entrega dessa empresa para o capital estrangeiro, porque é isso que vai acontecer. Ainda existem alguns juízes que têm uma visão nacionalista, progressista e correta desse processo, tanto que a gente conseguiu uma liminar que suspendeu temporariamente a privatização dessas seis empresas distribuidoras. E veja o ponto em que chegamos, quando a decisão dela não é cassada, mas o presidente do TRT simplesmente suspende a liminar que ela dá. Não é que a decisão dela caiu. O presidente usa de uma artimanha, de um artifício, que é possível dentro do Judiciário, para simplesmente passar por cima de uma decisão, que foi uma decisão baseada em dados e fatos concretos e que levaram essa juíza lá do Rio de Janeiro do TRT do trabalho a suspender o processo, sob o ponto de vista exatamente trabalhista. O que vai acontecer com os trabalhadores se esse processo seguir? Ela só pediu um tempo para que se apresentassem estudos, e nem isso o governo quis fazer.
Romulus Maya: Fabíola, a gente sabe que o Brasil é um país continental de forma que os rios, desde a colonização, têm um papel fundamental na integração nacional. A água é um recurso estratégico para agricultura, para indústria, para as pessoas beberem e poderem sobreviver e a gente sabe que a privatização da Eletrobras envolve tudo isso, envolve represa.. Nos EUA, as represas são todas públicas, 100%, não tem nem a participação privada. Nenhum país, como o Brasil, não há lugar no mundo privatizando uma infraestrutura dessa maneira. Quão estratégico é esses recursos, que são geridos pela Eletrobras, que tornam necessariamente a operação deles algo público, que não pode ser privatizado? A gente está falando aí de eclusa para navegação… investimentos então que têm em eclusa para a pessoa poder fazer navegação em hidrovia, a vazão da água, água para agricultura e para o consumo das pessoas, a própria energia elétrica, a segurança do sistema… Então, por que é que isso não pode ter uma lógica privada, privatista, Fabíola?
Fabíola Antezana: Bom dia, Romulus, tudo bem? Porque, a gente estaria perdendo a nossa soberania nacional. A gente tem colocado muito isso nos nossos debates. Não se trata apenas de uma empresa que gera, transmite e distribui energia elétrica, é uma empresa que controla muito mais do que só a energia elétrica que chega nas nossas casas. Nós controlamos os cursos de água, nós controlamos todas as áreas de mata, que ficam em torno dos nossos empreendimentos. Na semana passada, saiu uma matéria dizendo que os EUA patenteou mais um produto brasileiro, mais uma fonte da nossa biodiversidade, se não me falta memória: o bacuri. Com isso, as universidades federais do Norte, que estavam fazendo estudos para viabilizar algumas propriedades homeopáticas desse produto, tiveram que parar, uma vez que está patenteado agora pelos EUA, né? A gente viu isso acontecer com o cupuaçu e com o açaí, quando o Japão os patenteou. Então, assim, é perder de fato, é entregar os nossos cursos de água, é entregar os minérios, que também estão ali por baixo, para esses estrangeiros. Veja que, quando estava na discussão da medida provisória 814, que tratava dos sistemas isolados que estão ao Norte do país, foi enxertada uma emenda que tratava da aquisição da flexibilização de terra por estrangeiro. Qual seria a necessidade de colocar isso em um projeto desse, se não fosse exatamente vislumbrar para, além de ocupar a superfície, você ter acesso àquilo que está por debaixo dessas terras? Então, é uma discussão muito ampla, uma discussão de fato nacionalista, que engloba a soberania. Como você bem disse, EUA, Canadá, Austrália, que têm uma matriz hidrelétrica, eles têm praticamente toda a sua matriz hidrelétrica na mão do Estado. A China. A China está toda na mão do Estado. Eu nem cito a China, porque todo mundo fala do comunismo, né, e “Deus me livre o comunismo”. Mas, EUA, Canadá, Austrália, todos na mão do Estado
Romulus Maya: Aqui na Europa também. Na França, a principal matriz na França é nuclear, mas todas as represas… tem alguma coisa mais relacionada à segurança nacional do que uma represa que pode alagar uma cidade inteira? Então, tudo aqui na mão do Estado, é segurança nacional
Fabíola Antezana: Exatamente. Recentemente, aqui no Brasil, a gente teve alguns rompimentos de barragem e eu não me refiro ao rompimento de Mariana. Eu falo de pequenas centrais hidrelétricas no estado do Mato Grosso, nós tivemos três represas que romperam no início do ano e que não foi dada nenhuma visibilidade. Agora, você imagina uma grande represa, como são os empreendimentos que estão nas mãos da Eletrobras, que não recebam o devido cuidado e que, por ventura, possam vir a ter algum desastre desse tamanho
Romulus Maya: Fabíola, eu desconhecia essa informação para você ver como realmente não foi noticiado. Vou até te pedir, se possível, para escrever um pequeno artigo, alguns parágrafos pra gente, relatando isso, que eu acho que é um argumento muito interessante contra a privatização, olhando o exemplo estrangeiro dos campeões do liberalismos aí, dos americanos e mostrando o que já está acontecendo no Brasil. Então, eu acho que é importante divulgar essa informação, não tenha dúvida de que o Duplo Expresso vai dar divulgação máxima a isso aí
Fabíola Antezana: Ok. Perfeito
Wellington Calasans: Fabíola, dando sequência aqui a nossa conversa, eu gostaria de saber como é que os eletricitários vão manter essa luta para que seja evitada a privatização da Eletrobras, considerando sobretudo que opinião pública é totalmente favorável à ação de vocês?
Fabíola Antezana: Bom, Wellington, desde o início desse processo nós temos feito diversas atividades nos estados, ações no parlamento, pressão sobre os parlamentares e, agora, esse é o momento de intensificar essa pressão. A gente está se aproximando de um período eleitoral, isso não pode ser desconsiderado, os parlamentares não querem votar pautas que sejam controversas, esse é um dos motivos pelos quais essa pauta tem tanta dificuldade de apoio dentro do Congresso Nacional. Ontem, nós fizemos uma grande atividade nos portões da Eletronorte do Pará. Para a próxima semana deverão haver algumas esferas em aeroporto, a participação dos trabalhadores nas audiências públicas, que estão convocadas no âmbito de câmara e senado. No dia da votação, que vai ser terça-feira, que está prevista a votação do PL 10332, que trata das empresas distribuidoras, a gente vai ter uma equipe boa aqui em Brasília para fazer essa pressão, esse corpo a corpo com os parlamentares. E, nos estados, a gente está tratando de alguma atividade maior para que chame a atenção desse processo, a mobilização também dos políticos locais. A gente sabe o que é que representa, principalmente para esses estados onde estão essas distribuidoras, a perda dessas empresas. São empresas ditas ineficientes, são empresas ditas com incapacidade de operação, mas o que não se considera são os locais onde essas empresas estão atuando, né, na região amazônica, é no semi-árido do Nordeste, são os estados com os menores IDH. Piauí é o último na lista de desenvolvimento humano aqui do Brasil… é o terceiro, perdão… Alagoas é que é o último. Então, assim, a alta inadimplência se deve também ao local onde eles atuam e a gente vai estar cada vez mais chamando a sociedade. Hoje, a gente vai estar fazendo uma grande movimentação de rede com um novo twitaço. A gente fez um twitaço, durante a greve, ficamos em segundo lugar nacional, quinquagésimo internacional. Hoje, a gente vai estar fazendo um novo twitaço em defesa da Eletrobras pública, Fora o Wilson Pinto, que é o presidente da empresa e que trouxe de forma bem acelerada esse processo de privatização para dentro das nossas empresas. E a gente vai seguir por aí, buscando a opinião pública, fazendo as nossas reportagens, tentando a inserção na mídia e aumentando a pressão
Romulus Maya: Ô, Fabíola, você não tenha dúvida de que o espaço do Duplo Expresso está sempre aberto para essa iniciativa e até estranha que outros sites não tenham dado o devido destaque ao movimento da greve de 72 horas. Mas, eu queria perguntar justamente isso, Fabíola. Há previsão de novas paralisações? Porque há uma limitação muito grande, por ser um serviço essencial, na disciplina que rege a greve, né? Tem que manter 75%, salvo engano, uma coisa assim, que realmente diminui o impacto do movimento. Aí eu pergunto, como a gente está vendo já a justiça do trabalho tentando quebrar o movimento sindical… os petroleiros tentaram parar lá, a juíza determinou dois milhões para cada sindicato, uma multa impagável, imagina? Ainda mais agora, quando a receita dos sindicatos, com a reforma trabalhista, caiu 90%. Então, eu pergunto se o Judiciário também está prejudicando esse movimento, a própria disciplina legal por ser um serviço essencial, e se tem novas paralisações. E, lembrando sobre esse seu comentário aí que você fez, que é o seguinte: é uma questão de integração nacional, integração energética e nacional. É evidente que, na Amazônia e no semi-árido nordestino, vai ser deficitário e é justamente por isso que a política energética tem que ser pública. Nenhuma empresa privada vai operar aquilo ali. Então, você tem que trabalhar com subsídios cruzados, com a região que é lucrativa para financiar… O Brasil é ou não uma federação? A gente quer excluir? Então, vende logo! Vende a Amazônia, vende o Nordeste… Ué, se é uma federação, a gente tem que unir eles e participar de um projeto de desenvolvimento. Então, é evidente, essa é a razão. Justamente por ela ser deficitária, Fabíola, é justamente por isso que tem que ser pública e por isso que o resto, o filé mignon, também tem que ser, para dar um desconto quando for comer a carne de pescoço lá, roer o osso. Então, você deu o exemplo claro, é justamente por ela ser deficitária que tem que ser pública. Mas, eu queria te perguntar isso: tem novas paralisações? E, atenção. Cadê os políticos desses lugares? Eu espero que, com a proximidade das eleições, isso ajude lá na sua mobilização, porque ninguém, no Nordeste, vai votar em uma pessoa que autorize a privatização das distribuidoras lá, da Chesf, das outras empresas lá subsidiárias, ou da própria Eletrobras, da holding. Idem na Amazônia. Então, vamos conscientizar, fazer um movimento. A gente tem aqui, Fabíola, um movimento com a Maria Lúcia Fatorelli de expor quem vota a favor e contra a auditoria da dívida. Eu acho que tem que organizar a mesma coisa, colocar quem está a favor, porque esse ano é ano de eleição
Wellington Calasans: Fabíola, como é que participa desse twitaço aí, Fabíola?
Fabíola Antezana: Olha, a partir de 10 horas, a gente vai estar postando as artes com a hashtag Eletrobras Pública, Fora Wilson Pinto, que é a nossa principal reivindicação nesse momento. A gente entende que não adianta parar o processo de privatização no âmbito do congresso, se o presidente continua dentro da empresa, ameaçando vender ativo por ativo e fazendo um assédio moral coletivo sobre os trabalhadores. Então, a partir das 10h, a gente já vai estar aí nas redes sociais com esse twitaço. Agora, nós temos, sim, a previsão de uma nova greve. Ao mesmo tempo em que a gente está na luta contra a privatização da Eletrobras, a gente está em pleno data base, né, negociação de acordo coletivo. A empresa veio retirando cláusulas que dialogam diretamente com essa questão da privatização, como a questão de demissão em massa, a reposição de quadro de pessoal, a garantia de instituições formativas, que garantem direitos da categoria, e tudo isso na mesma toada privatizante, né? Então, a partir do dia 25 [de junho de 2018] já foi deliberado, em diversas assembleias, ainda têm algumas para deliberar, mas a partir do dia 25 a gente faria uma nova paralisação, dessa vez por tempo indeterminado, sabendo, claro, de toda a dificuldade por conta da Justiça do Trabalho. Essa última greve nossa foi considerada legal, o que já foi uma grande vitória. A gente imaginava que, logo no início, a gente teria um movimento decretado ilegal, mas, apesar da legalidade do movimento, por ser um serviço básico, foi colocada a garantia de 75% dos trabalhadores, em seu efetivo, no trabalho. Nós questionamos essa decisão, nosso entendimento é um pouco diferente, não é assim que a gente trata a questão de energia elétrica. Se for levar por percentual de trabalhadores, alguns serviços essenciais podem ficar prejudicados. Nos nossos movimentos grevistas, nós nunca deixamos de atender 100% da operação e manutenção, exatamente para que não ocorra nenhum tipo de perturbação no sistema, para que nenhuma região fique desabastecida de energia, por entender que não dá para você tratar esse produto de forma irresponsável. Então, nós fizemos algumas intermediações juntos ao TST que não alterou a sua forma de ver, mas a gente conseguiu finalizar a greve de uma maneira bem exitosa. Foi uma greve na qual a gente teve um apoio político muito grande, partidos políticos, de movimentos sociais, outros movimentos sindicais, que a gente não tinha tido no passado essa expressão de apoio, né?
Wellington Calasans: Solidariedade. Uma solidariedade até
Fabíola Antezana: Exatamente. A gente nunca tinha tido um movimento de solidariedade tão grande como a gente teve agora, nessas 72 horas. Eu acho que essa foi a nossa maior vitória. Deu uma nova esperança para os trabalhadores que estão nesse setor de continuar nessa luta, de continuar fazendo o seu trabalho, de continuar lutando por uma Eletrobras pública
Wellington Calasans: Olha, Fabíola, eu quero agradecer a você por ter vindo aqui, a gente sabe que é muito cedo aí no Brasil, mas eu fico muito feliz por você fazer esse sacrifício aí de estar com a gente logo cedo, ouvi aí choro de criança, (risos). Você está aí no seu limite, e eu não vou estender muito, até porque já esgotamos aqui o debate com você por hoje, mas como Romulus falou, e você já sabe disso, você já tem o contato aí da nossa produção, a Camila está em permanente contato, quando tiver qualquer novidade, lembre que a gente está ao seu lado, ao lado dos eletricitários, ao lado da empresa estatal Eletrobras para que possamos deter o domínio sobre esse importante e estratégico pólo do desenvolvimento, porque dominar energia, sobretudo elétrica que é a que afeta do mais pobre ao mais rico é de fundamental importância para o desenvolvimento de qualquer país, então vocês estão no caminho certo e vocês sabem que podem contar com a gente aqui sempre, tá bom?
Fabíola Antezana: Perfeito, Wellington. Muito obrigada, Romulus, por toda oportunidade. A gente vai estar, sim em contato com vocês, a gente mantém desde o início desse processo, a gente agradece a ajuda e 10 horas hoje a gente tem o twitaço. A gente ficou em segundo lugar na terça fazendo meio rápido, a gente tem a semana inteira esquematizado isso e a gente quer ficar em primeiro lugar nas redes sociais.
Wellington Calasans: Tá bom. Então vamos também lá no nosso Twitter entrar nessa onda gigantesca aí da Eletrobras. Todo mundo dando essa “luz” ao brasileiro, para entender a importância dessa empresa para o Brasil e para os brasileiros. Um abração, Fabíola e tudo de bom para você!
Fabíola Antezana: Um abraço e bom dia!
Wellington Calasans: Bom dia!
* Transcritora Maíra Valente
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