“Bolsa desaba e dólar dispara” – como Globonews e CBN criaram o “coxinha”
Por Romulus Maya, para o Duplo Expresso
Assim como o leitor abaixo, você lembrará deste texto quando vir um “coxinha” analfabeto político (e econômico!) arrancar os cabelos porque “o dólar disparou” e “a bolsa desabou”. Assim como ocorre hoje, depois do anúncio da demissão de Pedro Parente:
Vou republicar então!
— Romulus Maya (@romulusmaya) June 1, 2018
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COMO GLOBONEWS E CBN CRIARAM O “COXINHA”
(texto originalmente publicado em maio de 2017)
Hoje (5a feira 18/5/2017, dia seguinte à divulgação do áudio do grampo em Temer) fiquei o dia todo pendurado na Bandnews, por conta dessa bomba. Fazia anos que não ouvia coisas do gênero, como CBN (que tava fora do ar hoje).
É impressionante como essas rádios de noticia são “para yuppies”:
– Todas têm “colunista de vinhos”; “investimentos no mercado financeiro”; “alta gastronomia”; “viagens”; “empreendedorismo e startups”; “fitness” (sim: em inglês!); “comportamento (descolado)”; etc.
Não é à toa que a classe média brasileira – ouvindo isso 24h por dia (no carro, na sala de espera do dentista, no táxi…) – passou a se achar “empreendedor”, “investidor”, “sofisticado”.
“Muito diferente do povão”, né… fala sério!
O que eles não veem é que não valem o que eles pensam que valem “em dólar“.
O que eles não veem é que não valem o que eles pensam que valem “em dólar“.
O valor deles é diretamente proporcional ao da economia brasileira.
Eles não são “tradable“.
Não podem ser exportados: só o Brasil os compra “pelo valor de face”.
Dessa forma, eles não vão bem se o Brasil for mal.
E aí não podem mais viajar pra Miami com tanta frequência…
Não por acaso, cada grande desvalorização cambial causa um enorme ódio na classe média:
– Da noite para dia ela “descobre” que não vale o que ela achava que valia… “em dólar”.
O novo câmbio, baixo, é o choque de realidade que a acorda do sonho…
– … do sonho americano, bem entendido!
E a nova viagem à Disney, no câmbio desfavorável, esfrega isso, dolorosamente, na sua cara…
De maneira inexorável…
Como só números sabem fazer:
– Você não vale o que você achava que valia…
E é nessa hora que ela se dá conta de que o seu bolso é diretamente proporcional ao – “maldito!” – Brasil.
Sim…
O Brasil daquela gentinha “indolente”, “morena” e nada “refinada”.
Que não sabe harmonizar vinhos, não lê livros sobre “liderança” e que – imagina! – está a anos luz da nova série-fenômeno do Netflix…
Também pudera: nem falar português direito eles falam… que dirá ver série em inglês!
Piada, né?
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Entendem como o choque cambial é dolorido?
De uma hora para a outra a classe média é lembrada, sem muito tato, de que ela está mais para “aquela gentinha” do que para um…
– … americano!
“Ninguém merece”, né??
Mas é a verdade, ora!
Aceita que dói menos:
– Você, classe média, vale tanto quanto o Brasil – no seu conjunto!
Se ele, como um todo, vai bem, você vai bem…
Se ele vai mal, você vai mal!
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Problema:
Com o austericídio da “PEC da Morte” – mesmo que focado quase que exclusivamente no povão – não tem como o Brasil – no seu conjunto – ir bem.
Por isso:
Tsc, tsc, tsc, classe média…
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To divagando, mas enfim…
Dá pra entender em parte o fenômeno “coxinha” ouvindo essas rádios de notícia 24h e a Globonews.
De novo:
– Com “colunista de vinhos” (importado$!); “investimentos no mercado financeiro” (“compro dólar?”); “alta gastronomia” (a “trufa” também é importada, sabe…); “viagens” (em dólar!); “empreendedorismo e startups” (igualzinho à Califórnia!); “fitness” (sim: em inglês!); “comportamento descolado (ou seria “cool”?)”; etc.
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Um amigo confirma: “você vê 4 horas de Globonews por dia e vira um ‘democrata eleitor da Hillary’. É inevitável…”
Ao que respondo: lógico. A linha editorial econômica é a da Febraban. Nas vozes de Miriam Leitão, Sardenberg e cia.
Com o discurso:
– Isso beneficia você, (projeto de) yuppie!
Malandrão…
Agora você é um ‘investidor’ da Bolsa!
Uau!
E tá no caminho do ~sucesso~ com os preciosos ensinamentos de obras seminais como:
– “Pai rico, pai pobre”;
– “O Segredo”; e
– “O monge e o executivo”.
Já sabe “se vender”, “liderar” e… “empreender”!
Com um arsenal desses ninguém $egura!
E, é claro, na entrada e na saída do quadro daquele colunista econômico na rádio:
– Comercial da corretora!
(“num oferecimento da XP investimentos”)
Sim porque o grosso do dinheiro do (projeto de) yuppie vem de especulação na Bolsa…
E não do salário dele no fim do mês (!)
E, consequentemente, do emprego dele…
Do tra-ba-lho!
(“essa coisa vulgar”)
Portanto, o seu bolso depende MUITO mais de o seu emprego continuar existindo…
Do que de quanto subiram as ações da Vale e do Itaú no trimestre.
Dessa forma, o (projeto de) yuppie depende ~muito mais~ de a economia real ir bem…
Do que de o “Mercado” ir bem.
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Vemos coisas como funcionários públicos defendendo reforma da previdência e reforma trabalhista (!) Se falar em privatizar o setor dele dá um chilique… mas, fora isso, quer mais é que privatizem o mundo inteiro (dos outros!). O mantra assimilado é: “não pode ter Estado porque, se tiver, eles vão roubar”.
Sonham com um mundo em que Armínios Fragas debatem política pública e em que a população fica devidamente afastada de qualquer influência no processo decisório, só “escolhendo” (?) se mandará o Fraga, o Meirelles ou o Levy.
Pequenos comerciantes, autônomos, profissionais liberais, pessoas que têm um pequeno comércio ou escritório, consultório, etc., acabam por empregar alguns funcionários (além da doméstica em casa, é claro!).
São tão povo quanto os seus empregados. Ou, no máximo, um extrato superior da classe trabalhadora.
Pois hoje, com a captura ideológica aqui descrita, essas pessoas se consideram “empresários”… “empreendedores”! E se acham “importantíssimas” porque geram esses… empregos. Pior: repetem – e talvez até mesmo achem (dissonância cognitiva explica) – que “só elas trabalham nesse país”…
E consideram a classe trabalhadora desprezível: “sempre querendo passar a perna no patrão”.
Ah, e “mamar no Estado”!
Estado esse que são elas, pessoas “de bem”, as que “trabalham duro”, que sustentam…
Estado esse que são elas, pessoas “de bem”, as que “trabalham duro”, que sustentam…
– … “com esses impostos altíssimos… uma injustiça absurda!”
– Impostos que, “quando não roubados pelos malditos políticos, são gastos com esses vagabundos aproveitadores…”
– “Vagabundos esses que, reduzidos à sua torpeza clientelista, mantêm esses mesmos ladrões no poder”…
– “Ambos se aliando para, juntos, roubar a riqueza criada pelo Brasil que trabalha”…
– “Num ciclo sem fim de roubalheira institucionalizada!”
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“Hunf…”
– “Brasil de merda! Como eu queria poder morar em Miami!”
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Ou seja: a classe média está no 99% mas se crê mesmo no 1% – e, por isso, sustenta socialmente o interesse econômico do… 1%.
No genial dito que circula pela internet:
A classe dominante não tem ódio.
A classe dominante tem astúcia.
O ódio ela terceiriza e não se expõe.
O que não falta são Bolsonaros (e Bolso-minions!) para defendê-la.
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“Wall St.” – tão perto… e tão distante…
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— Romulus Maya (@romulusmaya) June 1, 2018
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