Preparando o Estado para a Soberania: Heróis e Ideologia nacional

Por Felipe Quintas, Gustavo Galvão e Pedro Augusto Pinho

Não existe Nação Soberana e Desenvolvimento sem solidariedade nacional e objetivos nacionais permanentes. Solidariedade e objetivos nacionais precisam de uma Ideologia Nacional para fundamentar uma visão própria e de mundo, compartilhada coletivamente por seus cidadãos. Em resumo um Estado-Nação precisa de uma Ideologia Nacional para nascer, sobreviver e prosperar.
Os Estados-Nações do Velho Mundo normalmente não têm muita dificuldade de conformarem uma Ideologia Nacional poderosa, porque são, em sua grande maioria, constituídos de uma única etnia básica que, desde o início dos tempos, luta contra seus vizinhos por sua própria sobrevivência. Luta mesmo. Quase todos têm genocídios e injustiças terríveis para acusar seus vizinhos. A lealdade étnica está enraizada até o fundo da alma desses povos. Assim bastou muito pouco para que esses povos constituíssem sua Ideologia Nacional na virada do século XIX para o século XX.
A Rússia é um exemplo extremo de como é um trabalho fácil constituir e enraizar uma forte Ideologia Nacional. Basta que as crianças estudem um livro de história da Rússia. A forma como eles lutaram pela própria sobrevivência e venceram exércitos tidos como invencíveis que queriam exterminá-los deve ser extremamente motivante para qualquer criança ou adulto desse país. Deram a volta por cima contra os poderosos conquistadores mongóis, poloneses, suecos, franceses e alemães.
Os Russos devem achar aborrecidas as histórias de super-heróis. Eles se acham descendentes de verdadeiros heróis de carne e osso. Mas não estamos falando dos heróis dos livros, estamos falando dos próprios antepassados que invariavelmente participaram de guerras terríveis pela sobrevivência do povo e tem histórias reais para contar. Esse é apenas um caso extremo. Em todo o Velho Mundo vemos a rivalidade étnica ou religiosa como base inquebrantável da nacionalidade.
No Novo Mundo, a situação é muito diferente. Somos intrínsecamente constituidos de povos multiétnicos e multirreligiosos. É inconcebível para um cidadão do Novo Mundo entender uma etnia ou religião em especial como inimiga mortal de sua Nação. Mesmo porque essa etnia ou religião, provavelmente, também é parte constituinte de seu Povo.
Por esse motivo, em nosso continente é muito mais difícil construir e enraizar uma Ideologia Nacional forte. Os EUA possuem uma máquina de propaganda nacionalista que funciona 24 horas por dia, dia após dia, há 200 anos para manter viva essa Ideologia Nacional, que, no caso deles, é de ser o Povo Excepcional, escolhido por Deus para levar a democracia e a liberdade literalmente para o Universo.
Haja visto que em centenas, milhares de filmes lutam para salvar o mundo até contra forças extraterrestres, sem contar os terroristas, nazistas e comunistas malvados terríveis. Toda essa ideologia se baseia no gens “maravilhoso” inoculado por uns tais de “Pais Fundadores”.
Na América Latina, isso foi muito difícil de ser constituído e seus países sofrem há séculos de falta de rumo, soberania e solidariedade nacional.
As maiores exceções são Cuba de Fidel e Guevara, México da Revolução de Pancho Villa, Zapata e Cárdenas, e Venezuela de Bolívar. Tratando de Bolívar, os EUA têm um verdadeiro horror a esse nome, porque Bolívar não apenas deixa os “Pais Fundadores dos EUA” no chinelo como intelectual e humanista, mas também porque o heroísmo e as aventuras verdadeiras dele sozinho superam em muito a de todos os super hérois da Marvel. Pena que a América do Sul não tenha uma Hollywood para contar sua história….
Por esse motivo, esses três países tiveram e têm momentos históricos de superação nacional admiráveis e são exemplos para muitos. Eles têm uma base de onde podem construir e sempre reconstruir uma Ideologia Nacional, ainda que levando em conta que no Novo Mundo, esse deve ser um processo contínuo em razão da ausência de rivalidade étnica.
E o Gigante da América Latina? Como ele conseguiu ser o país que mais cresceu no mundo no momento histórico em que o mundo mais cresceu na história. Fomos os campeões de desenvolvimento mundial entre 1930 e 1980. Isso é um mérito incrível para um país que não tem uma Ideologia Nacional e nem heróis nacionais reconhecidos como existem em outros países.
Será que não temos? Será que nunca tivemos?
Tivemos. Nossa Ideologia Nacional foi o generoso positivismo rio-grandense que se popularizou por meio do Varguismo. E temos heróis. Além dos pouco lembrados heróis da Independência e de lutas populares, temos os heróis do positivismo e do Varguismo. Vargas em primeiro lugar. Que herói norte-americano chegou aos pés do heroísmo de Vargas, que se matou quando tudo já estava perdido para poder dar a volta por cima e vencer, já morto, contra um aparentemente invencível ataque múltiplo oligárquico-estrangeiro sem que nenhum de seus liderados precisasse se sacrificar por ele? Que país pode se orgulhar de um herói de tamanha generosidade?
O verdadeiro arquétipo do herói moderno é latino, porque luta contra inimigos muito mais poderosos a favor dos mais fracos e se entrega mesmo de forma espontânea com toda sua alma, paixão e generosidade sem perder nada de sua humanidade tão humanamente falível… Mas admirável!
Mas nosso objetivo aqui é falar de Ideologia Nacional. E a nossa foi o Positivismo riograndense que precisou, como nos EUA, de uma Guerra Civil Regional para ser parido ao mundo, a Revolução Federalista, e de outras Guerras Civis Nacionais para se consolidar: as Revoltas Tenentistas dos anos 20 do século passado.

Felipe Quintas, doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense
Gustavo Galvão, doutor em economia, autor do Livro: “As 21 lições das Finanças Funcionais e da Teoria do Dinheiro Moderno (MMT)”
Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado
(Publicado em 14/08/2019 no jornal Monitor Mercantil, pag. 2, Opinião)

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