Os Três Lobinhos
Do blog “Linhas Incertas” de Markuns Vinicius Reis Amaral*, pela Redação do Duplo Expresso
Three Little Wolves (“Os Três Lobinhos”) é um desenho animado da Silly Symphony (“Sinfonia Ingênua”, série de 75 desenhos animados produzidas pela Walt Disney Productions entre 1929 e 1939). Lançado em 18 de abril de 1936 e dirigido por Dave Hand, este foi o terceiro desenho da Silly Symphony estrelando os Três Porquinhos.
Um desenho animado a lá Walt Disney é uma consonância e, em resonância em uma caixa muito antiga, multilateral. Em vários lugares os lobinhos estão lá. No lugar dos porquinhos em seus contos de fada, Hollywood já a transformou e contextualizou à moda de moda excroque, (execrável, mas… fofinho).
Shrek – o Ogro –, já está nas lancheiras de menininhos e menininhas nos jardins de infância. Mas os três lobinhos…
Os três lobinhos tem uma scene[1] especial. Nas lancheiras, nas capas de cadernos encontrados em qualquer papelaria pelo Brasil, eles estão, mas ao mesmo tempo não estão. Sua fotografia com as mãos dadas assando alguma coisa (o porquinho?) no quintal da casa do porquinho é invisível. Afim de constar: na imagem só aparece a casa do porquinho a churrasqueira no quintal. O observador sabe que tem carne na brasa, mas cadê a carne, neste caso, o toucinho?
Segundo relatos, (os três lobinhos) eles só agem juntos, invadiram a casa do porquinho, mas há quem duvide, porque os três lobinhos não eram estranhos ao suíno, ao contrário, eram assíduos frequentadores da residência.
Nem é preciso dizer que o porquinho sumiu? Ele nunca mais foi visto, daí, dizem as más línguas é que ele descansa em paz na barriga dos lobinhos.
Mas isso é intriga. Os lobinhos gostavam do porquinho. E também gostavam de scenes, fotografias e paparazzi aos seus pés pedindo entrevistas e autógrafos e claro, mais fotos, principalmente ao lado do porquinho. Um fazendo o “v” da vitória, o segundo, de patas abertas no cangote do porquinho, e o terceiro jorrando louvores de amor ao porco, “Esse porco é o salvador da pátria”, dizia.
Antes do porquinho desaparecer, ele andava em maus lençóis. Aliás, o lençol sujo do chiqueiro, estava mais sujo ainda naqueles dias dando trabalho a lavadeira que todo dia sempre se esforçava para tirar as manchas no ribeiro. Os lobinhos sempre pertos davam palpites a lavadeira que um dia resolver seguir, trocou a barra de sabão, feita por ela mesma, trazida de seu sítio nas redondezas, pelo sabão em pó multiúso que só era conseguido na cidade. Por coincidência, neste dia a lavadeira, que também era empregada doméstica do porquinho, foi a cidade comprar o tal sabão e a história a partir daí é a tal scene…
Depois desse dia, só deram os lobinhos. Na verdade só eles falavam sobre o que aconteceu, ainda mais quando descobriram que a empregada lavadeira também havia sumido uma semana depois do porquinho. Quer dizer, oficialmente sumiu, mas como o povo inventa muito é melhor dizer que ela se mudou do sítio porque senão vão falar que ela foi assassinada. Ora.
Não há nada a declarar sobre a preferência carnívora dos lobinhos. Eles agora falam do episódio em que conheceram o porquinho.
Um diz que adorava aquele porco. No seu Facebook há uma montanha se selfs com o consagrado porco. Ele e o porco no Balneário Camboriú, ele e o porco na caravana em Porto Alegre, e até uma em que eles estavam no hall de conferências de um hotel internacional em Windhoek, na Namíbia. O porco era viajado.
O segundo gostava tanto do porco que até cuidava da papelada dele. Todo aquele esculhamaço de resmas e resmas ele assobiava e carimbava com a pata do porco (o sinete do porco).
Já o terceiro era só amizade. Aquelas do tempo da juventude quando o porco começava a ganhar fama no país dos porcos. Ele chegou e ficou com o porco dizendo que tinha know-how e expertise e que estas palavras significavam muito no mundo fora do chiqueiro.
E os três juntos diziam em uníssono: Oinc! Oinc! O porco é o nosso rei!
Numa entrevista, os três falam do dia triste do desaparecimento. Câmeras de tevê do Rio de Janeiro e São Paulo focam em seus focinhos enquanto o primeiro pigarreia, o segundo soçobra em condolência e o terceiro suspira condoidamente. Os três lobinhos já sabem quais perguntas os repórteres farão e, para o bem do chiqueiro, o espírito do porquinho deve continuar.
Passado alguns meses, Shrek sai de moda nas capas das lancheiras, e até as próprias lancheiras dão espaço para tupperwares nas gôndolas. Ninguém mais fala do porquinho nosso rei, e a sua casa no chiqueiro há muito transformou-se ela no próprio chiqueiro.
Agora, no chiqueiro propriamente dito, os porcos reúnem-se para votar o novo rei. Um dos porcos fala do compromisso do porquinho nosso amigo e há um roncar de vozes de… protesto.
Sim, de protesto. Depois que o porquinho desapareceu alguém disse que ele foi embora com rios de bolota do celeiro em pacotes dos Correios despachados dia sim, dia não para não levantar suspeitas. Falaram de um caminhão suspeito que vira e volta estacionava na cancela da fazenda.
– Silêncio! – disse o primeiro lobinho.
– Não é hora de voltarmos ao passado, mas sim em pensar o futuro! – disse o segundo lobinho.
– Vamos votar! – disse o terceiro lobinho.
E assim os porcos elegeram como seu rei um… Se alguém disse um lobo, acertou. Se alguém disse que um lobo come um porco… É isso aí. Isso é tudo, pessoal.
That’s all folks! – isso é tudo pessoal, e não é nada pessoal.
* Markuns Vinicius Reis Amaral é um engenheiro civil que vive em Belém. Gosta de escrever e, além do blog “Linhas Incertas”, mantém ainda um outro – “Resultados e Controvérsias Vazias”.
[1] – Scene é uma sequência de ação contínua em uma peça, filme, ópera, livro ou… em um desenho animado.
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