O canto da sereia e a sua responsabilidade nas urnas
Por Wellington Calasans, para o Duplo Expresso
Em 1989 eu fiz campanha para Lula e votei nele. Ignorei a experiência de Brizola e a visão futurista daquele que era, disparado, o mais preparado político brasileiro naquele momento. Fui seduzido pela “onda 13”, pois – entre outras coisas – via os “famosos” cantando alegremente “Lula lá” e uma ameaça (que culminou como vencedora) “Collorida”. Anos depois, assistindo a uma entrevista com Lula ouvi do próprio a afirmação de que “eu (Lula) não estava pronto para ser o Presidente da República em 1989”. Era o que eu precisava ouvir para ter a certeza de que “a propaganda não iria mais influenciar nas minhas decisões”.
Fui me “vacinando” ao longo das últimas décadas. Tenho o orgulho de dizer que sempre votei em Lula. Sempre! Este ano Lula foi impedido e, com ele, eu e milhões de outros brasileiros. Desta vez o marketing tenta, em vão, me convencer de que “Lula é Haddad” (e vice-versa). Todos falam sobre a “ameaça fascista” de Bolsonaro. Agora, com a história de quem viu e viveu inúmeras experiências políticas em diferentes países, digo tranquilamente: Haddad não está preparado. Assim como Lula em 1989, Haddad é apenas uma “onda 13”, um marketing político. Os fatos já dizem isso.
Escrevo este texto após ter participado no final da tarde do domingo (23) de um bom debate onde os juristas Luiz Moreira e Romulus Maya (meu parceiro no projeto Duplo Expresso) convidaram a nossa comentarista Maria Eduarda Freire e falaram de uma maneira inquestionável: Haddad representa a vitória do PT Jurídico. Foi assessor de Tarso Genro no Ministério da Justiça e, também por isso, assim como Cardozo e Dilma se comporta como um “vaselina” nas questões delicadas. Tem como filosofia a substituição da soberania popular pelos plenos poderes punitivistas dos quadros da justiça.
Não falo da pessoa Fernando Haddad. Não tenho nada contra ele, pois sequer sei quem ele é como pessoa. Como político ele está exposto. O único êxito foi uma consequência de ter sido Ministro da Educação de um presidente como Lula. Trabalhou com um dos maiores orçamentos que a educação já teve. Como prefeito de São Paulo foi uma tragédia grega. Abandonou as bases e perdeu para o anônimo e insignificante Doria em todas as zonas eleitorais. O Brasil precisa de algo melhor do que isso.
Se é verdade que Lula indicou Haddad, isso prova apenas que ninguém é perfeito. Lula é bom, mas é infeliz nas escolhas. O STF é fruto disso, Dilma é fruto disso e o amor que o povo tem por Lula está sendo levado ao limite do “teste de fidelidade” com esta aposta no FH que lembra em muitas coisas o C de 1989. Mais uma Dilma? Não! Haddad é a encarnação da carta aos brasileiros. Numa análise mais crítica, Haddad é um Collor com roupa vermelha ou um FHC com os votos de Lula. Nada em Haddad pode ser visto como autêntico. É um produto do marketing eleitoral.
Nesta segunda-feira (24) os nossos dois comentaristas do Duplo Expresso defenderam, cada um ao seu modo, as candidaturas Ciro (com Paulo César Ribeiro Lima – para influenciar Haddad à esquerda) e a candidatura Haddad (com Ceci Juruá – por acreditar que Haddad fará “o que for possível”). Ciro não é Brizola, diriam aqueles que lembram de 1989. Todos nós sabemos disso. No entanto, Haddad está longe, muito longe, de ser Lula. Quem é quem nessa eleição sem Lula?
Se depois desses argumentos você ainda achar que Haddad é a melhor opção para o Brasil, nunca é demais lembrar que Bolsonaro pode derrotar o petista no segundo turno, a despeito do que diz a recente pesquisa IBOPE sobre chance de Haddad. Essa antecipação da disputa do segundo turno, ainda no primeiro, é o sonho da direita e do próprio Bolsonaro. Se a luta é “contra o ‘Coiso’”, Haddad não é garantia de vitória e poderá jogar a esquerda (a que temos pra hoje) por décadas num mar de incertezas. Para piorar, perderemos o poder de influência de Lula caso Haddad seja eleito e repita no Brasil o que fez em São Paulo.
Sobre pesquisas, há coisas que não estão bem encaixadas nelas. Como Haddad cresceu tanto se no Nordeste ele está estacionado? Se o Sul/Sudeste tem o maior número de antipetistas do Brasil, como explicar este crescimento? Será que isso não é “pegadinha” da Globo/IBOPE para humilhar o PT com uma derrota no segundo turno? Muita coisa carece de melhor explicação nessas pesquisas. De qualquer forma, o ideal é que todo e qualquer candidato que seja apresentado como “de esquerda” assuma antes do dia do voto os compromissos de revogação dos atos do Regime Temer e a reconstrução do Brasil e do Estado Social. Sem esse compromisso, estará a ser respaldado nas urnas para fazer o que os bancos querem.
Este texto não é para indicar A, B ou C, mas sim para dizer que o marketing político é o canto da sereia. Pense bem antes de votar. Avalie todas as possibilidades. Identifique sinais claros de nacionalismo, apreço pelas soberanias nacional e popular. Tente encontrar alguém que rejeite as políticas do Regime Temer e que tenha empatia com as questões sociais. Identifique o enfrentamento dos verdadeiros problemas e decida qual o candidato representa isso. É disso que precisamos: derrotar o fascismo “sem mi mi mi”.
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