“Lagartixa”: PT está disposto a, sem Lula, jogar para perder?

Por Romulus Maya, Piero Leirner & Patricia Vauquier

  • O PT não vai boicotar a eleição. Não vai abrir mão de reforçar o “13” na TV na campanha de Presidente. Ainda mais quando tem toda essa boa-vontade/ frustração associada à “marca” por causa do martírio de Lula. Revelador da lógica dominante é estrategistas do partido reconhecerem que a expectativa é chegar ao segundo turno com o Plano B para então… perder (!)
  • Acham isso bom o suficiente por garantir, i.e., segundo eles, a primazia do PT nas esquerdas e na futura oposição. Misto de cretinismo parlamentar e politicagem fisiológica, para preservação de gabinetes. O tal “ocupar espaços” na adversidade.
  • Não existe “referendo revogatório” 1 década depois!
  • A não ser que a lógica seja justamente essa: deixar “eles” (?) fazerem toda a maldade e, aí, chegar ao poder na ressaca. Mas, convenientemente, a partir daí apenas podendo fazer “mudança” cosmética, dado o estágio de consolidação da maldade.
  • O PT viraria algo como o PS chileno pós-Pinochet?

*

Do Facebook de Romulus Maya, debate a 6 mãos na seção de comentários:

Romulus Maya

Romulus Maya quem é o step da direita? Marina ainda?
Piero Leirner
Piero Leirner Nem se fala nela. O que é um sinal. Mas acho que eles vão de qualquer coisa, Haddad inclusive. Ele flui melhor com o agro…
Pq com o cerco apertando o Lula, os caras, enfim, topam tudo menos o risco. Tá mais fácil agir por dentro do PT que fazer o chuchu emplacar…
Ainda assim, para o tal mercado o melhor é controlar a eleição com uma disputa conhecida. Acho muito difícil o Alckmin não virar pro 2o turno, e o Bolsonaro já sentiu isso. Nesse exato momento a maior parte das variáveis tá no PT, e, claro, na justiça. Vamos começar a pensar que talvez seja mais fácil Lula se eleger e não deixarem assumir? E começar aquele bafafá jurídico? Vai ter um ano de enrolação, pelo menos…
Patricia Vauquier
Patricia Vauquier Piero, não sei como está o termômetro, mas você acha que dá pra sustentar o chuchu fora do Tucanistão? A rejeição dele no país é muito grande… E o Bolsonaro pode ser a alternativa contra tudo o que está aí… Ele tem um sentido meio Trump, só que mais burro.. Seria um bonequinho perfeito… Não? Quem tá numa sinuca de bico é o PT. Porque o Lula vai ficar fora das eleições e o PT vai ter que decidir o que fazer: se apresenta alguém ou se assume o golpe e se mantém fora da eleição. A minha visão é: o PT só ganha a eleição com Lula. Não adianta anticandidato nem plano B, porque vão perder.
Logo, se o partido apresenta uma candidatura fora o Lula, ele não só vai estar compactuando com o golpe como vai anular toda a luta que eleição sem Lula é fraude. Quando o partido vai levantar e se revoltar de verdade? As bases estão pedindo uma reação que se não acontecer vai desmoralizar o partido. O pior é que com todo esse golpe e a movimentação da esquerda ficou claro que não tem pra onde os petistas correrem. PSOL e PCO não são uma alternativa…
Piero Leirner
Piero Leirner Como diria mestre Yoda, com tantas variáveis incerto o futuro é…

 

 

Que variáveis? Do meu ponto de vista, uma candidatura não é um fato isolado. Ela só existe em relação às outras, e nesse momento todas estão se mexendo demais, sobretudo por conta da incerteza que a do Lula (do Judiciário, na verdade) impõe. Então os outros não conseguem se definir. O que a gente pode ver? Eu acho que a tal adesão do “centrão” ao Alckmin não foi pouco. Formou-se o mesmo tipo de coligação orgânica que sustentava FHC. E é preciso ver o que isso implica em termos regionais. Porque isso é um fator de MUITO peso na eleição presidencial.
Você notou o que foi o troca-troca partidário de uns meses atrás, antes da janela fechar? A grande debandada foi para o DEM, e o PMDB desidratou. DEM que já tem o presidente da Câmara, que fechou com Alckmin. Isso implica numa enorme cooptação de prefeitos. Imagino que nesse cenário SP acabe fechando, e pelo menos arrastando parte do norte do PR, sul de MG, parte de GO e DF, um pedaço menos significativo do RJ e provavelmente ES. Leia-se Sudeste expandido, capaz pelo menos de enfiar o cara no 2o turno. É pouco tempo, mas os caras vão colocar a máquina pra trabalhar, e mantendo o Meirelles como boi de piranha, e assim descolar o PSDB do Temer.
Bolsonaro pode bem ser o plano B ao Alckmin, mas, tenho insistido nisso, boa parte de sua força política vem do interior do RS e região expandida (SC, MS, MT, TO e alguns pontos do Norte). É rural. Mas sem prefeito, desidrata. E o ponto é que ele não conseguiu fazer um arco de alianças, pois ele simplesmente não tem o que negociar. Os prefeitos são pragmáticos, fechar com um cara que tem uma alta probabilidade de derrota pode ser um suicídio na relação deles com os futuros deputados federais. Não é como Trump, note bem, que foi eleito num sistema de delegação. Aqui essas coisas passam por um jogo de favores e reciprocidades que impõem uma representação indireta que é paralela.
O tal “Lula negociador” é muito isso, ele sabe quem são os políticos, e no seu governo esses sistema funcionou feito carro de luxo alemão. Dilma azedou a relação. Uma deputada e um senador me contaram, na festa de ano novo, que ela nunca sabia o nome dos congressistas. Esquecia. Perguntava, mesmo depois de “n” conversas, “quem é você?”. Todo mundo foi ficando “p” da vida.
Mas voltando. Então temos esse problema da elegibilidade do Lula. Eu, particularmente, acho que embora necessária, a ideia de “eleição sem L é fraude” induz a um outro problema: a de que a prisão de Lula é única e exclusivamente por um fator eleitoral. Não é. O problema precede as eleições, e a própria candidatura de Lula foi uma reação ao que estava acontecendo (lembra Lula? “foram cutucar a onça…”). Então a fraude é o Judiciário. O problema é que as eleições parecem ter se tornado também uma arma contra isso.
Agora, numa boa, acho que judiciário, mídia, exército, e TODOS OUTROS CANDIDATOS, incluindo Boulos e Manuela, tão cagando e andando se não deixarem Lula disputar. A eleição vai acontecer de qualquer jeito. Fraudada ou não. Já passamos por um golpe, não custa passar por outro, né? Diante dessa situação, olha só o que pode acontecer. O PT não transige, e Alckmin atrai para suas alianças Marina e Ciro. Aí a coisa começa a se complicar. Tenho uma intuição que esse é o plano FHC agora.
O ideal para eles é também conseguirem lançar o Haddad, pois é uma dupla jogada: se ele ganhar (o que acho improvável), devido à sua própria fraqueza política, vai ser obrigado a um tipo de composição estranha até o momento, já que o PMDB não está mais disponível. Se perder, Alckmin entra com toda a legitimidade, e aí Lula está liquidado politicamente.
Romulus Maya
Romulus Maya Patrícia, a anti-candidatura não é pra ganhar. É, já sabendo que vai perder, partir pra tática do desgaste/ empate, tentando tirar a legitimidade de quem entra. SP vai pro Alckmin até por conta da fraude na totalização. O TRE-SP é totalmente cooptado pelo PSDB. Estão no governo lá, aparelhando, há 24 anos! Tem uma matéria da Maria Cristina Fernandes no Valor (2017) sobre a virtual fusão entre Executivo/ Legislativo/ Judiciário em SP que dá a exata noção disso.

 

 

Daí vem a tranquilidade de Alckmin: sabe que vai estar no 2o turno, no mínimo, por conta desse “esquema”. Veremos, como em TODAS as eleições desde 2002, os institutos de pesquisa relatarem uma alegada “disparada na reta final” do candidato do PSDB na última semana do primeiro turno, que vai casar, “providencialmente”, com a dianteira – “surpreendente” – que o candidato do PSDB “vai abrir” – i.e., na apuração – com relação ao “terceiro colocado” (entre aspas mesmo).
É só puxar os números da última semana de todas as eleições desde 2002 nas pesquisas e contrapor ao resultado da apuração para constatar: Serra/ Garotinho/ Ciro 2002; Alckmin chegando com só 7 (!) de diferença para Lula em 2006 (isso explica, em parte, o “mistério” de ter tido no segundo turno menos voto que no primeiro); Serra/ Marina 2010; Aécio/ Marina 2014: na apuração, “surpreendentemente”,  ele “abriu” mais de 12 pontos em cima da Marina e “chegou” a so 8 de distância da Dilma.
O cenário com derrota de Haddad é o pior dos mundos. A disputa Haddad x Alckmin reduz a luta política deste ano a uma briga paroquial, eleitoral, PT-SP x PSDB-SP. Terrível. Enquanto o PT não for renovado com representação no comando proporcional de onde efetivamente tem voto, estamos lascados, na mão dessa máquina majoritária no PT-SP.
Patricia Vauquier
Patricia Vauquier Ulysses Guimarães fez exatamente isso, foi anti-candidato em 74 contra o Geisel. Não conseguiu fazer nada nem pro cheiro.
Romulus Maya
Romulus Maya Pat, o PT não vai boicotar a eleição. Não vai abrir mão de reforçar o “13” na TV na campanha de Presidente. Ainda mais quando tem toda essa “good will” associada à “marca” por causa do martírio do Lula. Não é o que a gente quer, mas temos que ser realistas. Quem manda é o PT parlamentar/ governadores – articulados com os “prefeitinhos”. Olha quantos assessores eles podem nomear. Quanta verba de gabinete. Tem que trabalhar com essa realidade. O partido está falido. Tem toda uma entourage que depende de renovação dos mandatos. Quanto mais contato venho tendo com o mundo político, mais vejo como isso pesa. É toda uma “economia” que gira em torno disso.
A despeito da sua vontade individual, a Gleisi fala em “boicote” quase como bravata. Nunca conseguiria impor.
Revelador da lógica dominante no PT é aquela parte final de artigo recente do Nassif em que ele diz ter conversado com estrategistas do partido: “a expectativa é chegar ao 2o turno com o Plano B para então perder”.

 

 

Ele não fala, mas com certeza entra aí nesse cálculo o fator fraude na totalização casada com as “pesquisas” e a tal “disparada na reta final”. Eles acham isso bom o suficiente por garantir, i.e., segundo eles, a primazia do PT nas esquerdas e na futura oposição. Misto de cretinismo parlamentar e “politique politicienne” (politicagem fisiológica, para preservação de gabinetes; o tal “ocupar espaços” na adversidade).

 

A Wikipedia em francês me socorre:
“Politique Politicienne” – (Péjoratif) attitude des hommes politiques consistant à se préoccuper des questions de pouvoir entre politiciens et partis politiques davantage que de la politique au sens étymologique du terme, c’est-à-dire des affaires de la cité.
Traduzo livremente como:
“pequena política” ou “politicagem (fisiológica)” – (uso pejorativo) comportamento dos políticos que consiste em dar mais atenção às disputas e acertos de poder entre os próprios políticos e os seus partidos que à “política” no sentido etimológico do termo, ou seja, os “problemas da polis”.

 

Erro crasso, na minha opinião. Lula estará liquidado politicamente com uma derrota dessas – duplamente a despeito dele (e das bases). E eles não aceitam, mas o PT sem Lula, hoje, é nada. Ainda mais com a escalada do arbítrio seguindo livremente no ciclo do Golpe, sem que o Judiciário seja colocado em xeque com a exploração máxima do ativo político “candidatura largamente favorita” vs. “veto do Judiciário”, que se coloca frontalmente contrário ao povo. Arma melhor que essa não teremos nesta geração política.

 

Mas, aqui, a “politique politicienne” se soma à antiga “lógica da lagartixa” no PT:

 

A questão do enfrentamento do Judiciário – i.e.: caso se queira, efetivamente, parar o Golpe – é “quando”. E não “se”.
De que adianta, tal qual a lagartixa, seguir permitindo que o Judiciário continue a devorar pedaços da cauda do PT – dos quais a sigla prontamente se despede buscando, em fuga apressada, sobreviver (Dirceu, Genoíno, João Paulo Cunha, Vaccari, Palocci, entre outros) – se o predador agora mira, inarredavelmente, a cabeça e o coração do réptil: Lula?
Novamente: o Judiciário – patrocinado pelos EUA e pela Finança – não atacam a pessoa física de Lula, mas sim a sua obra! É evidente – ou, ao menos, deveria ser – que tão logo destrua a cabeça e o coração, o Judiciário triturará todos os membros remanescentes do animal. Certificar-se-á, assim, de que não haverá, em nenhuma hipótese, reprodução da antiga lagartixa por “brotamento” a partir das patinhas que restaram”.

(Lula candidato “sim ou sim” – o inadiável enfrentamento do golpe do Judiciário – 18/mar/2018)

 

Faço um adendo: outros membros que essa apressada lagartixa – tomada pelo instinto de sobrevivência individualista – vai largando pro Golpe devorar, para além de Lula, são o povo e a soberania nacional.
Ora, não existe “referendo revogatório” 1 década depois!
A não ser que a lógica seja justamente essa: deixar “eles” (?) fazerem toda a maldade e, aí, chegar ao poder na ressaca. Mas, convenientemente, a partir daí apenas podendo fazer “mudança” cosmética, dado o estágio de consolidação da maldade. O PT viraria algo como o PS chileno pós-Pinochet…
Patricia Vauquier
Patricia Vauquier concordo com tudo… e vai ter que ter mais 20 anos de ditadura da toga pra galera se recuperar.
Romulus Maya
Romulus Maya Mais: vejam o artigo recente no PHA assinado por “Tiradentes”. Sei quem está por trás desse pseudônimo. É um figurão petista. Ele fala claramente em “Perón/ Campora”:

 

 

Cotejando com a expectativa de derrota relatada pelo Nassif (já ouvi também), vemos que esse vai ser o discurso vendido às bases. Mesmo sabendo que não vai rolar. Já explicamos por que é uma operação de venda fraudulenta, repetida como mantra por certo PT (de SP), em “Perón/73”: novo golpe do “Plano B” para furar olho de Lula (27/jun/2018).
Esperam, contudo, com isso impedir que surja o protagonismo de outra força nas esquerdas. E eleger as bancadas/ governos estaduais. É a isso que esses “estrategistas” estão resumindo a gravíssima luta política deste ano. Aliás, desta geração! Estamos muito mal de representação, infelizmente, com essa liderança na máquina do PT. Não há estadistas. Há “politique politicienne” quando muito: “ocupar espaços”!
Piero Leirner
Piero Leirner É isso que a correlação nos Estados tem mostrado mesmo, uma enorme fragmentação. Para mim, eles estão dando essa eleição de bandeja. E vamos falar a verdade: o PT começou a ter problemas em “unificar” a esquerda faz tempo. Tem isso do PT paulista, mas é um certo PT paulista. Tem outro que ficou esvaziado lá em São Bernardo, como deu pra ver no dia da prisão. E Berzoini? Quando entrou para o governo Lula deixou a CUT na mão do Marinho. Que aconteceu? Nada. Berzoini e toda essa galera compôs com Dilma e ela lacrou o caixão.
Sei lá, vou ler essa semana essa tese do meu colega, Pedro Floriano, sobre o PT, que foi uma tese premiada e tal. Espero entender se tem algo mais estrutural do que dança das cadeiras dentro do PT. De repente vamos ter que comprar passagem só de ida pra te fazer companhia aí na Suíça…
Só um outro detalhe: fiquei 15 dias em Curitiba até ontem. Conversei com bastante gente lá, e posso dizer que a Gleisi não é essa unanimidade toda. Era carta fora do baralho, mas agora com essa exposição que tá tendo como porta-voz do Lula (que justamente impôs ela na Presidência porque já seria anódina) talvez ganhe força eleitoral. Ou seja, para ela também acaba sendo um jogo duplo, e Lula preso traz benefícios…
*
*
*
“Para perder”: debater com Alckmin na Globo quem faz mais PPP…
*
*
*
Discutimos esse e outros temas no Duplo Expresso de Domingo, há pouco (com alguma exaltação):
*
*
*

Facebook Comments

Romulus Maya

Advogado internacionalista. 12 anos exilado do Brasil. Conta na SUÍÇA, sim, mas não numerada e sem numerário! Co-apresentador do @duploexpresso e blogueiro.

Romulus Maya tem 1734 posts e contando. Ver todos os posts de Romulus Maya