Trump, indústria das “fake news” e afins…

Luiz Carlos de Oliveira e Silva (Professor de Filosofia)

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1. Há quem ache que a derrota de Trump nessas eleições estadunidenses pode enfraquecer a indústria das “fake news” e a extrema-direita mundo afora. Eu, cá com os meus borbotões, considero que, em caso de derrota de Trump, o segundo prognóstico tem maior chance de vir a se tornar realidade do que o primeiro.

2. A indústria das “fake news”, com objetivo político, é tão velha quanto a própria política. Mas há outro aspecto, tão importante quanto este, para sustentar a avaliação de que a indústria das “fake news” não sofrerá qualquer abalo com uma eventual derrota de Trump. O aspecto é este: não há apenas uma indústria de “fake news”, há também uma demanda por “fake news”!

3. A oferta de “fake news” tem as suas razões de ser e a demanda por “fake news” também tem as suas. É a conjugação destes dois conjuntos de razões – as da oferta e as da demanda – que me permite dizer que a indústria das “fake news” veio para ficar. As razões da oferta são sobejamente conhecidas, vejamos as razões da demanda…

4. As “fake news” obtêm o sucesso que obtêm não só porque têm uma poderosa máquina por trás delas. Boa parte do sucesso das “fake news” advém do fato de elas ensejarem uma “visão de mundo”, organizando e dando sentido a sentimentos, percepções e compreensões que, sem elas, permaneceriam confusos e desarticulados. Como sentimentos, percepções e compreensões confusos e desarticulados são geradores de ansiedade, as “fake news” promovem apaziguamento no psiquismo. E elas não apenas apaziguam as almas, elas também fornecem uma “narrativa”, isto é, fornecem uma oportunidade de performance social no mercado das opiniões!

5. Fato é que as “fake news” são úteis para quem as produz e para quem as consome, pouco ou nada importando se elas não têm respaldo na realidade dos fatos, já que o ser humano tem a tendência a tomar como verdade o que vem ao encontro dos seus interesses, necessidades ou preconceitos. A indústria das “fake news” é uma via de mão dupla. Este é o busílis. Quem não entender isto, não entenderá a fundo o fenômeno.

6. As “fake news” juntam a fome com a vontade de comer: deve-se a isto, a meu ver, o sucesso delas e o fato de elas serem inevitáveis… Não quero com isto dizer que elas não devam ser combatidas. Mas, como combatê-las, de uma perspectiva de esquerda? Lançando “fake news” contra “fake news”, como não raro acontece? Este é, me parece, um caminho, digamos, “natural”, mas, de um ponto de vista de esquerda, equivocado. Senão, vejamos…

7. A indústria de “fake news” com fins políticos experimenta atualmente um extraordinário salto de qualidade, com a instrumentalização dos “big data” e com a utilização em escala “astronômica” das “redes sociais”. Como isto envolve muito dinheiro e forte presença nos centros de poder da “web”, o extraordinário salto de qualidade na indústria das “fake news” está a serviço dos interesses da direita.

8. É por isto que, combater “fake news” com “fake news” é travar uma batalha perdida já de antemão. Do ponto de vista da esquerda, só há um modo eficaz de minimizar o poder da indústria das “fake news”: a elevação do nível de consciência política do povo. O que a esquerda no poder e fora dele fez neste sentido nas últimas décadas? Lamentavelmente, a resposta é: quase nada.

9. É o nível baixo de consciência política que torna o poder da indústria das “fake news” tão importante. E não se eleva o nível de consciência política combatendo “fake news” com “fake news”. O modo mais imediato de elevação do nível de consciência política de um povo é apresentando a ele um programa mínimo, no qual o povo possa reconhecer os seus dramas e as saídas para a situação de penúria em que vive.

10. Combate-se, à vera, “fake news” com um programa nacional, popular e democrático, um programa capaz de ser tomado como seu pela ampla maioria do povo brasileiro. A pergunta que não quer calar está aqui: o que as esquerdas têm feito para levar ao povo um tal programa? As atuais eleições têm servido para isto?

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