Diários da Pandemia: O povo com medo da morte e da fome

Relato de militante do Quilombola Raça e Classe, São Paulo (SP)

O que eu vou relatar, quem é militante de comunidades e favelas vai entender: antes, quando você entrava em uma comunidade, por mais que tivessem problemas para resolver, as pessoas não desanimavam, a comunidade tinha interesse em correr atrás. Saia às ruas, cobrava, estava se politizando; e nós, militantes, trabalhando para formar o maior número possível de pessoas com conscientização política.

Quando Bolsonaro se elegeu, não foi culpa da militância, mas sim dos políticos de esquerda, que fizeram tudo errado. Ao que parece, com esse governo fascista e com a pandemia da covid-19 isso ficou terrivelmente visível, as comunidades e favelas, o povo vulnerável, estão abandonadas por essa esquerda cirandeira. Os poucos militantes que ainda existem estão atuando nas comunidades. Antes, o povo tinha fé e esperança, agora não estão tentando mais e como se todos estivessem apáticos, sem expressão, olhares vazios, sem vida, sem brilho.

Para eles agora pouco importa, como muitos me falam, porque lutar. Estamos esquecidos pelos políticos, pela justiça e muitos acham que até por Deus. Em muitos barracos de madeira têm muita gente chorando de fome e porque perdeu algum ente querido e não pôde dele se despedir, como uma senhora relatou chorando:

–  Eu não pude ver o meu filho. Só vi de longe eles colocando um saco preto em um caixão, me entregaram os papéis e falaram “Vê se é o nome do seu filho e se está correto”.

O que eu poderia falar pra ela diante da dor que ela estava sentido?

Vai ficar tudo bem, a senhora vai ver…

Não tenho mais palavras ou argumentos.

Comunidade Kampala, na cidade de São Paulo, após incêndio com causa desconhecida.

Em uma das comunidades que eu estou sempre presente, até porque somos vizinhos, pegou fogo, já tentaram tirar eles dali porque vai passar o metrô e justo ali vai ser a estação. Nós, do CSP Conlutas, estamos em campanha para arrecadar material pra construção dos barracos que pegaram fogo e de outros que estão condenados. Saímos perguntando como começou o incêndio cada da um fala que foi de um jeito, mas na verdade ninguém sabe.

Não apareceu nenhum político para ajudar ou consolar aquele que não tem nada ou o que pouco tinha e o fogo comeu. As desapropriações, sem um pingo de pena ou dó desse povo, continuam. Nós, militantes, somos ameaçados direto. Alguns estão até com medo porque “cadê a esquerda aonde estão aqueles que ajudamos a eleger”? Não sei onde estão, ou melhor, sei sim: estão se preparando para as eleições e o povo que se lasque. O companheiro de luta da FNL (Frente Nacional de Luta) ligou perguntando:

Companheira, você sabe aonde tem algum terreno ou lugar, estou com 70 famílias despejadas? 

A minha vontade foi a de levar todos para os gabinetes e deixar eles acampados lá, mas isso é pedir para apanhar da polícia…

E não falo desse ou daquele partido, estou falando da esquerda, dos partidos de esquerda, que têm parlamentares e vereadores eleitos, que têm respaldo para atuar junto ao Ministério Público. Aqui em São Paulo, as coisas estão acontecendo (assim como no Rio e em outros Estados) com o mesmo modus operandi: incêndios e morte de jovens negros da comunidades, por policiais ou por milicianos.

“Frente Ampla” do quê? Parece até piada! “Movimento Povo Sem Medo”: esse eu mudei o nome, porque se esses pseudo políticos soubessem o que o povo pobre sofrido está passado seria: Povo com medo da morte e da fome.

Agora vão começar a chegar cestas básicas nas comunidades, juntos com os santinhos, pois é hora de alimentar o curral eleitoral de cada político, mas eles mesmos não iram porque têm medo. Eu só não sei se é medo da covid-19 ou da raiva do povo… Está muito difícil ter esperança de um futuro, mas eu tenho um lema “Enquanto não houver uma sociedade igualitária os ricos não terão paz“.

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