Frituras na equipe econômica: “ponte para o futuro” se tornou a pinguela que tem para hoje


Frituras na equipe econômica: “ponte
para o futuro” se tornou a pinguela que tem para hoje
Por Ciro 
Os teóricos de conspiração tanto da direita quanto da
esquerda imaginam que exista uma cabala de banqueiros que sabem e controlam
tudo o que está acontecendo.  Talvez isso
até fizesse sentido num passado quando a arte econômica era tanto quanto mais
pragmática, entretanto hoje em dia a captura ideológica se tornou tão grande
que o mercado realmente acredita piamente naquilo que publica.
Ou seja, a recuperação contratada pela coalizão do
impeachment estava realmente esperada, mesmo não havendo nenhuma razão concreta
para se acreditar que o ambiente político se tornaria mais estável (a quanto
tempo se fala da delação da Odebrecht – alguém imaginaria que essa delação
fosse algo menos que uma bomba nuclear sobre todo o sistema político?) ou mesmo
que uma economia com problemas sérios de alavancagem não apenas pública mas
também privada iria suportar uma contração fiscal e monetária conjunta de tal
magnitude.  Alguém realmente esperava que
um projeto que ganhou a eleição (populista que seja) pudesse ser substituído
por tal “ponte para o futuro” sem nenhum tipo de comoção social?  Alguém realmente esperava que nessa
conjuntura de total instabilidade política uma política de profunda austeridade
pudesse passar maiores dificuldades?
A construção do discurso anti-corrupção que veio junto
com a Lava Jato e o impeachment é populista em sua natureza – não é possível
vender a idéia de que é necessário fazer sacrifícios porque não há dinheiro
quando ao mesmo tempo se propaga a idéia de que não há dinheiro porque
“eles” roubaram.  Uma dessas
opções exige sacrifício da população, outra só exige que a população saia as
ruas pedindo por sangue – que surpresa que a população tenha escolhido a
segunda.

A inflação de 10% em 2015 é culpa da Dilma
(conseguiram vender essa mensagem para o grande público). Já trazer a inflação
para 4,5% a qualquer custo já em 2017 é uma decisão política deliberada já no
início do governo Temer, ainda em sua interinidade. Deve-se lembrar que a
“credibilidade” da autoridade monetária dependia na visão ortodoxa
desse “A TODO CUSTO”. 
Entretanto esperava-se (erroneamente) que tal custo fosse bem mais baixo
do que o que está sendo cobrado.  Agora
ou se recua no aperto monetário e coloca em risco a tal
“credibilidade”, ou se dobra a aposta e se coloca em risco a
continuidade do governo, ou a continuidade de sua participação no governo.
Imagino que a ideia original seria que a mudança do
regime (a mídia econômica e consultorias de mercado trataram o impeachment
brasileiro nesses termos, mas não foi golpe, claro) e a ascensão de um
super-time tecnocrata respeitado internacionalmente e que piamente acredita no
credo ortodoxo dos nossos dias pudesse gerar entusiasmo o suficiente no mercado
internacional para que estes ignorassem todas as coisas óbvias que se falou
acima.  Seria conquistar o mercado para
um programa de investimentos, concessões e privatizações por parte de consórcios
internacionais em termos mais interessantes para tais investidores.  O mercado iria exigir entretanto algumas
reformas antes de trazer seus dólares para cá.
A primeira de todas é a reforma que garante que
pagaremos uma dívida que não pode ser paga. 
Trata-se da PEC do Teto. A avaliação era que a trajetória da dívida é
insustentável, mas o governo colocou na constituição que nós venderemos a mãe e
cortaremos a comida dos filhos, mas os juros 
pagaremos.  Isso já dá uma certa
garantia, especialmente para o investidor que não percebe que os filhos que
ficarem sem pão não vão ter brioches também e podem se revoltar contra o pai.
A segunda é a reforma trabalhista criando condições de
se fazer uma recuperação do nível de emprego (e assim alguma manutenção da
demanda uma vez que a propensão para o consumo é maior quanto menor é a renda)
sem resultante crescimento da massa salarial, mais ou menos o que está
acontecendo nos EUA agora. O desemprego está baixo, mas a massa salarial não
cresce na mesma proporção – ou seja, há mais pessoas trabalhando em
subempregos, em trabalhos temporários, em meia jornada, etc.  Ou seja, uma reforma que se permita que se
gere empregos mas que se pague mal ao mesmo tempo.
A terceira é a reforma que é realmente a mais
necessária e que é a maior preocupação em termos da trajetória de dívida, que é
a reforma da previdência. Necessária porque trata de uma questão estrutural e
não conjuntural.
Entretanto, como mesmo com desemprego em baixa os
americanos do Rust Belt resolveram lançar os dados e arriscar a imprevisibilidade
de Donald Trump a terem a perspectiva de mais anos de subemprego, chegou-se a
uma situação de tempestade perfeita.  O
dinheiro volta para os EUA, isso porque em tempos de instabilidade fugir para o
dólar é a melhor aposta, ganha-se (ou perde-se menos) se Trump for um desastre
ou se Trump for um sucesso, de qualquer forma, é a opção de menor risco.  Resultado é que não se pode mais contar com o
dinheiro do investidor internacional como motor da nossa recuperação.
Ou seja, a “fada da confiança” não passou
por aqui.  Como a fada do dente, a fada
da confiança nada mais é do que o dinheiro dos pais.  O brasil arrancou um dente permanente e
colocou embaixo do travesseiro (PEC DO TETO), só que o papai está viajando
fazendo negócios com um tal de Trump. 
Nada de fadinha para a gente…
Diante dessa situação, há pânico e confusão
total.  E como a culpa do tratamento não
estar funcionando é sempre do médico, ele é colocado na berlinda.  O Ministro da Fazenda é fritado e o mesmo
trata de tentar colocar a culpa no seu colega de ministério, o presidente do
BACEN. Quem será o pato oferecido na frigideira?
Como alternativas dentro da ideologia ortodoxa
corrente, as opções seriam 1) ajuste de curto prazo no lado da receita, especificamente
CPMF ou reonerações 2) horizonte mais largo para a queda da inflação possibilitando
queda mais imediata da taxa de juros. 3) Uma espécie de Quantitative Easing
tupiniquim para gerar crédito que pudesse dar folga para as empresas e
famílias.  Ou, se fossem muito ousados,
as 3 ao mesmo tempo.
Todas essas alternativas sofreriam de alta resistência
por parte de alguns setores da coalização do impeachment.
Enquanto isso a lava jato continua a toda.  Imagino que a classe política contasse com o
mercado nacional para enquadrar a mídia de forma que se permitisse a anistia e
a sobrevivência do sistema político atual com o fim da lava jato.  Isso não aconteceu. Talvez o mercado
internacional ache que a lava jato ainda tem como baratear o Brasil ainda mais.

Ou talvez se esteja justamente apostando é na
destruição total do sistema político brasileiro para possibilitar a instauração
de uma ideologia liberal aberta e livre das velhas elites políticas
patrimonialistas, com a predominância de uma nova elite (entenda-se
corporações, MP e Judiciário) já capturada ideologicamente.  Se apostarem nisso, correm o risco de perder
para essa direita que agora passou a ousar a dizer o seu nome e mostrar a sua
cara, e que não é nada liberal.

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Romulus Maya

Advogado internacionalista. 12 anos exilado do Brasil. Conta na SUÍÇA, sim, mas não numerada e sem numerário! Co-apresentador do @duploexpresso e blogueiro.

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