Um ano de Emmanuel Macron: O tamanho do golpe

Por Patrícia Vauquier, para o Duplo Expresso

Dia 7 de maio fez um ano da eleição do presidente mais jovem da história da República Francesa. Eu me abstenho de fazer qualquer alusão a sua história ou aos meios pelos quais ele utilizou-se para chegar ao poder. O objetivo principal é fazer um balanço do que foi esse primeiro ano da presidência de Emmanuel Macron e como ele alinha a sexta potência econômica do mundo aos interesses do capital financeiro.

Na França, ao contrário do Brasil, não dá pra falar em golpe. Foram os 33% dos eleitores franceses que, ao votaram no segundo turno, elegeram o antigo ministro da economia de François Hollande. O candidato que se dizia “ao mesmo tempo, nem de direita nem de esquerda”. Macron, ao contrário de Temer, ascendeu ao poder eleito pelo povo francês e pelos que se abstiveram de se manifestar naquele domingo.

Como Temer, Macron tem a maioria do Congresso. Os deputados do partido La Republique En Marche nem se dão ao trabalho de questionar as diretivas do Executivo. Seja as reformas da Lei do Trabalho e da Lei de Imigração, ou o fim dos impostos às grandes fortunas. Seja os impostos para os aposentados ou o fim de benefícios estudantis. Quaisquer que sejam as diretivas, tudo o que vem dos ministros ou do presidente, ou ainda do primeiro ministro, é sumariamente aprovado.

Até seu antigo chefe, o ex-presidente François Hollande – um social democrata neoliberal que introduziu esse cadete na política – afirmou em uma entrevista que Macron é o “Robin Hood às avessas”: Ele tira do pobres pra dar aos milionários. Talvez Hollande tenha inveja do seu pupilo, mas a realidade mostra que a política econômica de Macron segue a de seu predecessor. Ou seja, ele acredita que dando aos ricos, eles vão investir na economia produtiva para dar às classes inferiores a oportunidade de um emprego, e assim, alcançar a integração na economia. Essa política lembra-me a máxima do ex-ministro da Fazenda no Brasil entre 1967 e 1974, Delfim Netto, que afirmava primeiro o bolo tem que crescer pra gente depois dividir”… Deixar o bolo crescer para dividir apenas entre eles é exatamente o que acontece agora na França.

A desigualdade aumentou, os ricos tornaram-se ainda mais ricos, e parte da classe média-baixa passou à classe baixa. Quem precisa do Estado são as pessoas mais vulneráveis. Como afirma o sociólogo Édouard Louis em seu recente livro “Qui a tué mon père” (Quem matou meu pai): A política tem poder de vida ou morte sobre as populações carentes. Na França, ou no Brasil, ou em qualquer lugar do mundo.

Assim como no Brasil, na França há uma forte repressão aos movimentos sociais. A população sem coragem de enfrentamento, assiste de braços cruzados o desmonte completo do Estado de bem-estar social. O país de 2018 parece que não se lembra daquele de 50 anos atrás, aquela da Primavera de 1968. O autoritarismo do presidente Júpiter impede de forma imediata qualquer manifestação ou revolta. A forte repressão aos movimentos sociais, às manifestações nas ruas, às greves das últimas empresas públicas – cujos funcionários e inclusive seus dirigentes protestam diante do regime de privatização do que ainda dá lucro ao estado – dão o tom do regime do cassetete* país adentro, ou dos mísseis país afora (leia-se na Síria).

Tudo isso porque ele precisa passar as reformas neoliberais a qualquer custo. Junto com a repressão, a mídia corporativa e golpista francesa – a mesma que representa no mundo inteiro o interesse da classe dominante mundial –, faz a narrativa. A Globo não é um privilégio brasileiro. Na França, as redes públicas e as privadas associaram-se numa ode ao presidente Júpiter.

No entanto, o povo francês conta com uma oposição pequena, mas incômoda. Ela vem ganhando cada vez mais força, ao chamar o povo às ruas a manifestar-se. Na França, ou no Brasil, o que mais incomoda aos homens no poder é o povo na rua. A rua é o único meio que o povo tem para tomar as rédeas do seu destino.

Imagem esq: “Mapa do Império Romano 50 DC” por © René Goscinny & Albert Uderzo (1986) | Imagem dir: montagem com
Asterix and Ideafix de © René Goscinny & Albert Uderzo, por © Shini-Smurf (2018) sobre foto de Emmanuel Macron discursando no Congrés de Versailes

Ainda bem que a França não tem petróleo, não tem riquezas naturais ou aquíferos como o Guarani, nem florestas como a Amazônia. Do contrário tudo estaria à venda. Um ano de Emmanuel Macron alinhou a França com o Brasil no mesmo passo, no mesmo ritmo em que o Estado está a serviço dos poderosos. Avec le Suprême, avec tout!

 


* A palavra “cassetete” vem do francês casse-tête, onde significa o jogo de “quebra-cabeça”. No mundo lusófono, significa o instrumento de “quebrar cabeças”.

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